7 de abril de 2018

RITOS SAGRADOS: As manifestações celebrativas da fé.


“Orar em conjunto, em qualquer língua, em qualquer rito, é a mais comovedora fraternidade de esperança e de simpatia que os homens podem contrair na terra”
(Anne Louise Germaine de Staël)[1].

Religião sem rito não é religião. Ela pode até não possuir um livro sagrado, mas não ter um rito (culto) que faça mediação entre os humanos e o divino é algo inadmissível. Durante séculos as tradições religiosas exercem uma grande influência em reunir pessoas que compartilham a mesma fé em diversos lugares. Seja o cristianismo no ocidente, o budismo na Ásia ou o Islamismo no oriente. A fé religiosa nunca deixou de ter influencia sobre a mente e o comportamento de milhares de pessoas ao redor do mundo.

E é nesse ajuntamento religioso que as crenças são praticadas e experimentadas em coletividade. Neste ponto os ritos são muito relevantes para que os integrantes do grupo se conheçam melhor e juntos compartilhem suas experiências de fé. Considerando esses fatos, podemos afirmar que ao estudar os ritos estamos conhecendo um pouco mais sobre a cultura humana.

Este texto tem o objetivo de mostrar a relação entre rito e o imaginário religioso; a importância dos espaços sagrados e refletir sobre os vários tipos de ritos.

I) O RITO E O IMAGINÁRIO RELIGIOSO.
A mente humana é perita em criar imagens e símbolos que são utilizados como representações do sagrado. Os humanos sempre no decorrer de sua existência, e nas mais variadas culturas, criaram e usaram imagens e símbolos para representar os seres espirituais e com isso ter algum tipo de contato com eles. E é por isso que o imaginário religioso e os ritos são inseparáveis. Eles são, de certo modo, o oxigênio da vida religiosa de um povo.

O sagrado é multifacetado, isto é, ele pode ter várias faces e representações, dependendo do contexto cultural e religioso de um povo. O sagrado pode ter um sentido para o judeu, outro para o cristão, outro para o hindu, outro para o budista e outro para o zoroastrista etc. E são nos ritos que a experiência do sagrado é praticada e vivenciada seja de forma individual ou coletiva. 
“Ora, o sagrado refere-se a algo que, presente e real, é inesgotável, absoluto, misterioso, majestoso, inefável, ou seja, sobre o qual se pode dizer alguma coisa, mas não tudo. É energia, poder e força criadora e destruidora sempre pronta a derramar-se, a desgastar-se, como a eletricidade. Perante o sagrado, o ser humano percebe-se limitado, relativo, efêmero, dependente. Seu sentimento é de maravilhamento, fascinação, estupor, temor” (VILHENA, 2005, p.59).
Para que possamos entender melhor essa relação entre o rito e o imaginário religioso, tomemos como exemplo o rito do zoroastrismo. Os zoroastristas têm o costume regular de realizar suas preces e devoções a Aúra-Mazda, O senhor Sábio, em casa ou no templo. Para os zoroastristas à presença da divindade no templo é simbolizada pelo fogo. “O fogo sagrado” representa a luz divina, a energia a verdade de Aúra-Mazda. 
“O culto coletivo envolve preces no templo, rituais em torno do fogo sagrado e uma refeição comunal. Assim como em casa, o fogo é o foco do culto no templo, onde é mantido continuamente aceso para que o fogo celeste de Aúra-Mazda possa fundir-se com ele. O fogo torna-se então um símbolo vivo que adquire algumas das qualidades sagradas de Aúra-Mazda” (WILKINSON, 2014, p.156).
Isso é apenas um exemplo de como o sagrado é simbolizado em um rito de um grupo religioso específico. Poderíamos mencionar os ritos de outras religiões, mas isso deixaria este texto muito extenso. Mas acreditamos que a partir deste exemplo ficou claro à relação que existe entre o rito e o imaginário religioso.

II) O ESPAÇO SAGRADO.
O homem religioso observa o mundo como uma criação de Deus (ou deuses), e por isso, tudo o que há no mundo pode ser visto como sagrado. Igrejas, sinagogas, mesquitas, templos, rios, desertos, terreiros, florestas, montanhas, etc., podem ser consagrados para o uso do serviço religioso. E são nesses espaços que os ritos são realizados, nos quais os fiéis em comunidade vivenciam à experiência religiosa.

Para que algum espaço seja considerado sagrado por um indivíduo ou grupo religioso é fundamental que aconteçam pelo menos três fatores:

  • A manifestação visível de alguma divindade, espírito ou força impessoal no local;
  • Algum sinal extraordinário que seja diferente da realidade cotidiana;
  • Ritos de consagração no espaço que foi “santificado” para o uso exclusivo do grupo religioso.

Esses fatores são essenciais para que algum espaço geográfico deixe de ser profano e passe a ser considerado como sagrado. 
“O ser humano religioso tem necessidade de identificar e mapear esses espaços a fim de configurar sua leitura e interpretação do mundo, suas maneiras de nele habitar, ser e estar, orientar suas trajetórias. Os espaços sagrados são pontos de referência capazes de transfigurar o que antes era indeterminado, amorfo, caótico em um cosmo ordenado e significativo” (VILHENA, 2005, p.80).
As pessoas buscam desesperadamente um sentido para à existência. Ao viverem em um mundo caótico e desorganizado, elas buscam nas religiões a oportunidade de terem um contato com o sagrado, e consequentemente colocar “ordem em suas vidas”. Quando à medicina e à ciência falham em seus objetivos, as igrejas, mesquitas, sinagogas, templos, etc., transforma-se em locais de refúgio e esperança para milhares de pessoas. E isso mostra que as religiões continuarão existindo por muitos e muitos séculos. 

III) TIPOS DE RITOS.
Existem vários tipos de ritos com propósitos diversos, e dependendo da tradição religiosa eles podem ser praticados de modos diferentes. Alguns dos ritos mais conhecidos são: ritos de celebração, de passagem, de consagração, de propiciação, as procissões e as peregrinações. 

Geralmente esses ritos têm em sua composição cânticos, mantras, orações, meditações, leituras/recitações de textos sagrados, sermões, recolhimento de ofertas, etc. E são os líderes religiosos ou algum grupo de fieis os responsáveis pela organização dos ritos.

Concluindo, os ritos são importantes para a preservação e fortalecimento da fé de um povo. É a partir deles que buscasse ter um contato com o sagrado. Mas não somente isso, os ritos podem unir pessoas e criar entre elas fortes laços de amizades e companheirismo. Nesse aspecto os ritos sagrados cumprem um relevante papel na sociedade de inclusão social. Ou seja, agregar por meio da fé pessoas que outrora não se conheciam.


Fontes.
CRAWFORD, Robert. O que é Religião. Petropolis: Vozes 2005.
WILKINSON, Philip. Religiões: guia ilustrado zahar. Rio de janeiro: Zahar, 2014.
VILHENA, Maria Ângela. Ritos: expressões e propriedades. São Paulo: Paulinas, 2005. 


[1] https://kdfrases.com/frase/141407

10 de março de 2018

ATEÍSMO: Visão de mundo, moral e espiritualidade.

Teoricamente a principal característica de um Estado laico é ser neutro em relação a religião e a fé. Ou seja, um Estado laico não tem, não persegue e nem defende qualquer tipo de religião. Ele apenas permite que as pessoas sob sua jurisdição tenham a liberdade de crer ou não crer em algum tipo de religiãoMas sabemos que nem todos os países seguem esse modelo. Existem nações que possuem uma religião oficial. E nem sempre o direito à liberdade religiosa é permitido. O nativo deve se submeter a religião oficial do Estado, caso contrário, poderá sofrer sanções.

Diferentemente, em um Estado laico o crente tem a liberdade de praticar a sua fé. E os descrentes, sejam eles ateus e agnósticos, podem manifestar a sua descrença com relação as religiões e deuses. É importante saber que sempre existiu na história da humanidade pessoas que questionavam e negavam a existência das divindades populares. Por exemplo, na Grécia antiga havia pensadores que não davam muito crédito aos deuses que constituíam o panteão mitológico grego.

E na atualidade a situação não é muito diferente. Milhões de pessoas que por algum motivo seja intelectual, emocional e psicológico, abraçaram o ateísmo como filosofia de vida. E afirmam que estão muito satisfeitas com a escolha que fizeram. 

O presente texto tem como objetivo oferecer ao leitor um conhecimento básico sobre a visão de mundo ateísta e também pensar sobre a possibilidade de haver uma moralidade e uma espiritualidade sem Deus.

1. COMO O ATEÍSTA VÊ O MUNDO?
Podemos dizer que o ateísta é um indivíduo que nega à existência de qualquer tipo de divindade. Para ele é incoerente acreditar em seres divinos cuja à existência não pode ser comprovada. Tudo que o acontece no mundo deve ser entendido e compreendido a partir da racionalidade humana e da ciência. Qualquer coisa que fuja desse padrão deve ser descartada. As várias ideias sobre divindades, segundo o ponto de vista ateístas, não podem ser comprovadas e por isso são irrelevantes.

Assim como no universo religioso existem crentes radicais e moderados; semelhantemente entre os ateístas existem esses dois grupos. Os ateístas radicais odeiam as religiões e não poupam esforços para combatê-las e destruí-las. Eles procuram convencer as pessoas sobre a inutilidade das crenças religiosas e do mal que elas podem fazer. Geralmente os radicais são fundamentalistas e intolerantes. 

Já os ateístas moderados seguem outro caminho. Eles apesar de olharem para as divindades e as religiões como meras superstições humanas; não se sentem incomodados com a presença delas. Para que perder tempo tentando destruir algo que não existe? E se as crenças religiosas, de certa forma, ajudam as pessoas para que combatê-las? Geralmente os moderados são mais inclinados a serem tolerantes e democráticos.

Mas seja radical ou moderado o ateísta não vê o mundo como o teísta vê. O teísta olha para mundo fundamentado em suas crenças religiosas. O ateísta olha para mundo fundamentando-se no naturalismo.
A visão de mundo através da qual o ateísta ponderado examina o mundo à sua volta é o “naturalismo”. Em contraste, a visão de mundo do teísta é o “supernaturalismo” (Walter, 2015, p. 49).
Quando se fala em naturalismo isso remete à ideia de que tudo no mundo tem uma explicação natural e cientifica. Ou seja, se quisermos saber como o universo, a vida animal e vegetal começaram a surgir; temos que encontrar as respostas com base no que observamos no mundo, e não fora dele. Mas, caso não exista respostas para determinados fenômenos naturais, o ateísta crerá que com o avanço da ciência uma resposta poderá surgir futuramente.

Em contraste, o supernaturalismo é a ideia de que além do mundo natural existe um mundo espiritual. Essa visão não nega a importância do mundo natural e do avanço cientifico, entretanto, o mundo natural limita-se as coisas terrenas e não satisfaz os anseios mais íntimos dos homens. Nesse sentido, os teístas defendem que a crença na existência de Deus pode proporcionar respostas para os indivíduos.
“O naturalismo pode ser descrito como a crença em que o mundo natural é um sistema fechado: nada existe fora dele, assim nada de fora o influencia. Em contraste, os supernaturalistas adotam uma visão de mundo cuja crença mais profunda é que a realidade é dualisticamente aberta, divisível em domínios naturais e supernaturais que interagem de uma forma ou de outra. [...] Saber exatamente como o natural e o sobrenatural interagem um com o outro e onde os limites de um termina e o outro começa é até certo ponto um mistério (Walter, 2015, p. 56) ”.
Pode-se perceber que não existe um combate entre ciência e religião, mas sim entre crenças pessoais subjetivas. Contudo, a visão de mundo naturalista tende a ser menos confusão do que a visão de mundo sobrenatural. Isso porque a primeira procura ser mais lógica e coerente com a realidade; já a segunda tem muitas dificuldades em explicar certos fenômenos “sobrenaturais” com base em pressuposto científicos, ela parte mais da fé religiosa pessoal. 

2. MORAL SEM DEUS.
Será que os ateístas por negarem a existência de qualquer tipo de divindade devem ser vistos como pessoas imorais e cheia de maldade? E os crentes seriam sempre amáveis e moralmente corretos só porque acreditam na existência de um Deus transcendente? Certamente não. A vida tem mostrado que tanto os ateus como os crentes são capazes de praticar atos de benevolência, altruísmo e caridade; como também serem capazes de matar e fazer injustiças. Em outras palavras, com ou sem Deus qualquer ser humano pode fazer o bem ou o mal.

Mas isso levanta uma pergunta: será que Deus é necessário para a moralidade? Fundamentando-se em suas respectivas visões de mundo e em suas “convicções pessoais”, ateístas e teístas teriam respostas muito divergentes. Sem dúvida os primeiros afirmariam que é perfeitamente possível existir uma boa conduta moral sem Deus; mas os segundos rebateriam dizendo que se Deus não existe, tudo é permitido. Infelizmente temos que reconhecer que no campo da moral não existe convergência entre ateísta e teístas.

Quais são as características de uma moral sem Deus? Essencialmente ela é naturalista, humanista e relativista.
É naturalista, firmemente fundamentada no entendimento do que significa ser uma pessoa. [...] A moralidade ateísta é humanista, fortemente centralizada no ser humano, não em Deus. Suas metas são terrenas, não celestes. Uma moralidade independente de Deus defende valores objetivos no sentido de estarem racionalmente fundamentados e não serem subjetivos. Mas esses valores também são flexíveis o bastante para levar em consideração circunstancias atenuantes que surgem de contexto, agente e situação. Em suma, os valores ateístas são relativos, não absolutos” (Walters, 2015, p. 168).
É possível ver que em uma moral sem Deus o indivíduo está livre para criar os seus próprios padrões de conduta moral e ética. Esse tipo de moralidade parte do pressuposto de que “o homem é o centro de todas as coisas”. Ele é senhor e juiz de sua própria vida, e não deve satisfação a nenhum tipo de divindade. Não existe a ideia de um suposto céu ou inferno que o constranja a mudar de conduta. Tudo depende dele e de mais ninguém.  

3. ESPIRITUALIDADE SEM DEUS.
O “ateísta místico” é uma nova categoria de descrente que tem surgido na sociedade contemporânea. Entretanto, a espiritualidade ateísta não é religiosa, mas secular. Ou seja, é uma espiritualidade que “religa” com à natureza e faz com que o mistico seja unido a ela. E isso produz o que alguns especialistas chamam de “experiência de pico”.  
“Essas experiências de pico trazem uma sensação de interligação com o universo e também de profundo deslumbramento com o puro mistério da existência, o fato inescrutável, mas maravilhoso, de que as coisas são. Apreço, gratidão e o sentimento de ter aprendido algo importante e libertador acompanhada tipicamente as experiências” (Walters, 2015, p. 198). 
Talvez a área da espiritualidade possa ser uma ponte de aproximação entre ateístas e teístas. Mas a diferença é que o ateísta se “religa” com a natureza e não com alguma divindade. Supostamente, as experiências de pico nascem da contemplação que o ateísta místico faz do universo. Há um tipo de mistério no universo que faz o místico se sentir parte do todo.

Considerando todos esses fatos, podemos dizer que existe uma certa aproximação entre a espiritualidade ateísta e o Budismo. Mas por que? No Budismo (mais especificamente no Zen budismo) não há necessidade de comunicação com nenhuma divindade. Ao meditar, o budista procura “limpar” a sua mente de todos os pensamentos negativos que lhe possam causar algum sofrimento. Nesse exercício meditativo o budista procura estar em harmonia com o seu “eu” interior o qual está ligado ao universo.

Podemos concluir que é possível, sim, existir uma espiritualidade sem Deus. Uma espiritualidade que é terrena e não celestial, que faz o indivíduo ficar admirado com a beleza e a grandeza do universo.

Fonte.
WALTERS, Kerry. Ateísmo: um guia para crentes e não crentes. São Paulo: Paulinas, 2015.

11 de fevereiro de 2018

CONSTRUINDO PONTES ENTRE CRISTÃOS E MUÇULMANOS: Um tema para o Ensino Religioso.


"Não haverá paz entre as nações, se não existir paz entre as religiões. Não haverá paz entre as religiões, se não existir diálogo entre as religiões. Não haverá diálogo entre as religiões, se não existir padrões éticos globais. Nosso planeta não irá sobreviver, se não houver um etos global, uma ética para o mundo inteiro" (Hans Küng).

Tentar construir pontes que aproximem as religiões é algo muito relevante e ao mesmo tempo desafiador. Relevante no sentido de que haja paz e respeito entre os seres humanos; e desafiador porque as religiões são tendenciosas a se proclamarem como donas de uma única verdade absoluta. E essa tendência negativa pode atrapalhar à prática do diálogo entre elas.

Os cristãos e os muçulmanos são grupos religiosos diferentes que se originaram em culturas distintas. E essa distinção pode, em algumas situações, criar um clima de hostilidade entre ambos. Mas isso só acontecerá caso os dois grupos se fechem e não tenham o interesse de se conhecerem melhor.

Mas afinal de contas, é possível cristãos e muçulmanos viverem pacificamente apesar das diferenças? Provavelmente sim. Entretanto, para que isso aconteça é fundamental que um queira conhecer e entender as crenças de outro, e tentar criar pontes de aproximação. Caso contrário, a boa convivência não existirá.

O objetivo deste texto é ser um auxílio para as aulas do Ensino Religioso e mostrar aos alunos e leitores a relevância de tentar construir pontes entre as religiões, mais especificamente entre o cristianismo e o islamismo. E também refletir sobre mal que o fundamentalismo religioso (cristão e muçulmano) pode causar na sociedade.

1. EM BUSCA DO DIÁLOGO ENTRE CRISTÃOS E MUÇULMANOS.

Para que exista diálogo entre duas ou mais pessoas é fundamental que primeiramente elas se conheçam. De modo semelhante, para que os cristãos possam ter um diálogo sério e produtivo com qualquer muçulmano é importantíssimo que se conheça as suas crenças.

Será que cristãos e muçulmanos reverenciam a mesma divindade? Para os muçulmanos quem é Jesus? Essas perguntas básicas são fundamentais para que os primeiros passos na busca do diálogo possa acontecer. Mas independente das crenças pessoais é necessário compreender o valor da pessoa humana.  
“Creio que o diálogo surge quando, antes das religiões, vemos as pessoas como seres humanos criados por Deus, finitos e certos da dependência total d´Ele. Com essa visão, a compaixão se manifesta, a mão pode ser estendida” (CALIXTO, 2006, p.31).
Em outras palavras, independente da religião todo ser humano é merecedor de respeito. Ninguém é obrigado a acredita ou concordar com tudo, no entanto, isso não significa que se deve odiar alguém por causa de sua escolha religiosa. Devemos acreditar que a compaixão pela vida humana é mais importante do que qualquer tipo de crença religiosa. 
“Se quisermos evitar em uma cidade, em um país e no mundo o clash of civilization, o temido “choque das culturas”, isso só poderá ser feito por meio do diálogo e da compreensão. Existem fanáticos no islã, mas eles existem também no judaísmo e no cristianismo, em toda parte. É claro que devemos nos opor à violência. Mas antes de tudo precisamos ter compreensão, tolerância, convicções democráticas para com as pessoas religiosamente engajadas. E aqui, o que ajuda muito é refletir sobre as raízes religiosas, sobretudo as raízes comuns ao judaísmo, cristianismo e islamismo na fé no único Deus de Abraão” (KÜNG, 2004, p. 252). 
Infelizmente a mídia mundial tem nos passado uma imagem negativa sobre os muçulmanos. Eles têm sido retratados como pessoas violentas, propagadoras do terror e da intolerância. Mas na realidade são os grupos minoritários e radicais os verdadeiros responsáveis por esses atos de maldade. Nesses momentos é fundamental termos um senso crítico e não aceitar como verdadeiro tudo o que a mídia mundial nos passa. Não somente em relação aos muçulmanos, mas sobre qualquer outra religião ou indivíduo.

A mídia mundial, em algumas situações, tem prestado um grande desserviço à paz mundial. Isso quando faz uma caricatura de um povo, baseando-se em atitudes nefastas de grupos radicais minoritários. E isso revela que os meios de comunicação não nos trazem informação, mas sim “desinformação”. Tenhamos muito cuidado!

2. CRENÇAS MUÇULMANAS E CRISTÃS.
Um ponto comum entre cristão e muçulmanos é que ambos acreditam no mesmo Deus de Abraão; mas a ideia acerca desse Deus é distinta entre as duas religiões. Por prestarem devoção a Deus usando o nome “Allá” muitas pessoas pensam que os muçulmanos creem em uma divindade diferente. Na realidade Allá é apenas o vocábulo “Deus” em árabe. É semelhante ao pronunciar “God” em inglês ou “Dios” em espanhol.

Na crença cristã existe o complexo dogma da Trindade em que Deus é reverenciado como Pai, Filho e Espirito Santo. Qualquer muçulmano não conseguirá compreender esse dogma cristão (e, diga-se de passagem, até hoje muitos cristãos não o entendem bem), esse dogma passa à impressão que os cristãos reverenciam três deuses, e que com isso eles seriam politeístas.

Mas na realidade os cristãos adoram um Deus criador, que tem um Filho (Jesus) como mediador entre os homens e que há um Espirito Santo que conduz a vida do fiel cristão. Temos que reconhecer que tudo isso causa muita confusão na cabeça de um muçulmano. Para o fiel muçulmano Allá não tem filhos e nem precisa de mediadores. E ninguém sabe como ele é, e nem se pode ter um relacionamento pessoal com ele.
Para o islamismo “Deus é irreconhecível. Ele próprio mantêm-se distante do homem, e Ele nunca pode ser conhecido pelo homem”. Para o cristianismo, Deus é mais pessoal e relacionável, e tornou isso possível através de Jesus Cristo como intermediário perfeito entre nós e Ele. Para os muçulmanos, Allah não precisa de intermediário, por isso esse papel de Cristo é rejeitado (Calixto, 2006, 101).
Sem dúvida as religiões não falam a mesma língua e são essencialmente contraditórias entre si. Mas será que isso é um motivo justo para se odiarem e fazerem guerra? Provavelmente não. Quando há interesse é possível existir diálogo e respeito com pessoas que pensam e tem crenças religiosas diferentes. Uma das formas para isso é dar mais atenção aos pontos que unem ao invés dos que separam.

A morte de Jesus Cristo na cruz é outro aspecto da doutrina cristã que qualquer muçulmano tem dificuldade de entender e acreditar. Na visão muçulmana é injusto um inocente ser punido pelos erros dos outros. Em outras palavras, cada um deve responder por seus atos. Conforme Calixto, “na doutrina do islamismo se nega a divindade de Cristo (Sura 112) e sua morte expiatória (Sura 4:158), duas mensagens fundamentais do cristianismo e da pregação evangélica” (2006, 104).

Aqui é um ponto que pode criar muita tensão entre cristãos e muçulmanos, caso não exista uma atitude de humildade para o diálogo. Durante mais de dois mil anos os cristãos têm pregado e ensinado que “Deus tanto amou o mundo, que entregou seu Filho único, para que quem crê não pereça, mas tenha vida eterna” (Evangelho de João 3,16 – Bíblia do Peregrino). Nenhuma religião vai negar as suas crenças, por que elas fazem parte de sua identidade. Se qualquer religião negar o que acredita consequentemente ela deixará de existir.

Todo cristão acredita que é possível conhecer o Deus único e ter um relacionamento pessoal com ele por meio de Jesus Cristo. Essa é uma das principais bases da doutrina cristã. E estamos certos que nenhum cristão verdadeiro deixará de crê nisso. Então podemos concluir que, qualquer muçulmano ou cristão que queria ser um pacificador, isto é, um defensor da paz, terá que saber respeitar as pessoas que tenham crenças diferentes. 

3. FUNDAMENTALISMO CRISTÃO E MUÇULMANO.
O fundamentalismo religioso é essencialmente um movimento ideológico e social. Ideológico porque os fundamentalistas querem que todas as pessoas pensem como eles pensam, e creiam como eles creem. Não existe liberdade religiosa e muito menos democracia. E como movimento social, o fundamentalismo religioso não vê o progresso cientifico com bons olhos. O avanço da ciência pode colocar em dúvida crenças religiosas tradicionais que durante muitos anos foram (e são) a base de sustentação da religião.

Nem todos cristãos e muçulmanos são fundamentalistas. Os fundamentalistas, geralmente, constituem um grupo minoritário organizado que procura defender propagar a sua visão de mundo na sociedade. Nem sempre existe espaço para o diálogo com essas pessoas.

O movimento fundamentalista não surgiu com os muçulmanos (quem pensa desse modo está muito equivocado), ele foi gerado por um grupo de cristãos protestantes americanos no final do século XIX. O racionalismo e o progresso cientifico estavam colocando em dúvida, e consequentemente em descrédito, os fundamentos essenciais da religião cristã. E isso fez com que cristãos protestantes conservadores reagissem contra o avanço cientifico.
"O fundamentalismo foi nos EUA, onde nasceu, um apelo para a volta aos fundamentos da fé cristã diluídos pelo modernismo: a veracidade absoluta da Bíblia, que deve ser entendida literalmente; a necessidade de conduzir uma vida virtuosa, com rezas e rituais regulares, rejeitando as tentações e a permissividade associada à grande cidade e enfatizando valores familiares; uma reafirmação de dogmas tais como a volta de Jesus Cristo e o último julgamento; um compromisso com um estilo de vida frugal, modesto e trabalhador" (DEMANT, 2014, 197). 
Neste sentido fundamentalista é qualquer religioso que faz apologia (defesa) aos fundamentos de sua fé religiosa; não permitindo que eles sejam ameaçados e destruídos pelos avanços da modernidade secularizada. Em outras palavras, o fundamentalismo religioso é um movimento que faz oposição ao progresso da modernidade.  

O fundamentalista, seja cristão ou muçulmano, procura entender o mundo a partir de suas ideias religiosas particulares. Aqui é possível perceber um grande equívoco. Isso porque qualquer fé religiosa é limitada para compreender o mundo em sua amplitude, e incapaz de responder a todas às dúvidas da humanidade.

Os fundamentalistas consideram-se os donos da verdade absoluta. E isso os estimula a saírem pelo mundo agregando novos seguidores para as suas comunidades. E a ideia defendida pela modernidade de que não existe apenas uma verdade, mas várias verdades, é repudiada pelos fundamentalistas.

Para um cristão fundamentalista “Jesus Cristo é a única verdade” e todos têm que acreditar nele. No caso dos muçulmanos somente “o sagrado Alcorão diz é a verdade” e todos têm que acreditar nele. Por causa de sua visão de fé restrita e limitada, os fundamentalistas podem criar um clima de intolerância religiosa no mundo. E esse é um dos grandes problemas sociais que os movimentos fundamentalistas têm causado em várias partes do mundo.

Então, qual deve ser a nossa atitude? Acredito que devemos saber separar o joio do trigo, isto é, saber distinguir quem é, e quem não é fundamentalista. Seria uma grande injustiça de nossa parte generalizar e afirmar que todos são fundamentalistas.

Há cristãos e muçulmanos mais civilizados e que estão abertos ao diálogo, e são defensores da paz entre os povos. São com esses que devemos ter uma aproximação e criar laços de amizade. E consequentemente não permitir que haja um “conflito entre as civilizações”.  


Fontes:
CALIXTO, Marcos Stier. O cristão e o islamismo: coleção diálogo religioso. Rio de Janeiro, MK ed. 2006.
KÜNG, Hans. Religiões do mundo: em busca de pontos comuns. Campinas: Verus, 2004.
DEMANT, Peter. O mundo muçulmano. São Paulo: Contexto, 2014.

21 de novembro de 2017

QUAL SERÁ O FUTURO DAS RELIGIÕES?: Uma breve reflexão.


Saber o que pode acontecer no futuro sempre foi e será uma tarefa complexa, isso porque nenhum de nós possui o controle sobre os acontecimentos futuros. No máximo o que podemos é levantar algumas hipóteses com base no que vemos no presente. Pois o presente é o resultado do que aconteceu no passado, e o futuro dependerá do que acontecer agora no presente. E quando se fala no futuro das religiões temos que seguir a mesma linha de raciocínio.

Por exemplo, o cristianismo ainda é a maior religião do mundo; isso em número de seguidores. Mas será que daqui há cinquenta anos ela continuará com esse status? Talvez não. E o que falar das outras religiões? Há conjecturas de que o Islã tome o lugar do cristianismo e se torne a maior religião do mundo, mas nada pode ser afirmado com absoluta certeza. As ciências sociais ensinam que à medida que o tempo passa as sociedades sofrem mudanças em suas estruturas, e esse processo afeta diretamente as religiões, pois elas também fazem parte das sociedades humanas. Em outras palavras, a religião de hoje não será à mesma de amanhã.

O presente texto tem o principal objetivo de provocar uma reflexão filosófica sobre o futuro das religiões; e também saber o que elas podem fazer para sobreviverem em um mundo que vive em constantes mudanças.


As religiões nunca mais foram as mesmas depois do progresso cientifico. Antes do advento da ciência quase tudo no mundo era explicado a partir dos conceitos religiosos. A origem do homem e do universo eram explicados conforme os ditames dos livros sagrados. Mas na medida que os tempos foram se seguindo as explicações religiosas foram perdendo sua credibilidade. A fé religiosa mostrou-se incompetente para responder muitas perguntas. A sociedade passou a usar à ciência e seus métodos para tentar explicar, de uma forma mais racional, os mistérios do mundo.

Hoje um dos maiores adversários das religiões é o secularismo, que a grosso modo pode ser definido como uma tendência em explicar o mundo de forma racional, sem precisar do auxílio das crenças religiosas. Vários países, mais especificamente europeus, são seculares em seu modo vida. Neles as crenças religiosas já não tem muita importância. Não que elas foram extintas por completo, mas que já não tem muita relevância na vida de boa parte da população europeia.

“As ideias sobre sagrado estão em declínio, de modo que aquilo que antigamente era visto como algo especial torna-se algo de gracejos de humoristas. As questões sociais e pessoais com as quais a religião se ocupava são hoje remetidas a assistentes sociais e psicólogos. As instituições religiosas tradicionais estão em decadência e os jovens voltam-se para os novos movimentos religiosas e seus cultos”.[1]  

Qualquer sistema religioso pode se desgastar com o tempo e se tornar irrelevante para as futuras gerações. Um cristianismo, um judaísmo, um islamismo, um budismo e um espiritismo que não conseguem se “revitalizar” e se adaptar aos novos tempos; com certeza não terão um futuro promissor, e entrarão na lista das “religiões que o mundo esqueceu”.

Sim caro leitor, existem religiões que o mundo esqueceu e se transformaram em peças de museu! Onde estão as religiões dos egípcios, sumérios, gregos, romanos, celtas, maias e dos incas? Nos museus e nos livros de histórias. Em outras palavras, são religiões mortas que não são praticadas e vivenciadas por ninguém. Hoje são apenas objetos de estudo de historiadores e arqueólogos.

Mas existe dentro das religiões contemporâneas um movimento de oposição ao avanço do secularismo, que é o fundamentalismo. “O fundamentalismo tem como meta fornecer um espaço para a expressão autentica da fé e reage política e socialmente contra o materialismo e o relativismo e hoje usa a tecnologia moderna para alcançar seus objetivos”[2]

O religioso fundamentalista é um militante. E ele fará de tudo para defender suas crenças, até usar à violência se for necessário. Não se sabe até que ponto o fundamentalismo é eficaz na luta contra o avanço do secularismo, no entanto, os efeitos são mais negativos do que positivos. Na obsessão de proteger a fé, em meio ao conflito, milhares de pessoas acabam sendo atingidas e com isso perdendo suas vidas.

Acredito que um caminho mais eficaz para preservação das tradições religiosas seja o caminho da ética e não o da força. Quando cristãos, judeus, muçulmanos, budistas e outros religiosos preocupam-se mais com o bem-estar da sociedade e não tanto com os seus dogmas, sem dúvida, as religiões serão mais relevantes e terão um futuro certo.

“Se a religião continuar a empenhar-se na transformação dos indivíduos e da sociedade por meios pacíficos, seu futuro está garantido, mas o uso da força não é compatível com o que os fundadores das religiões pregaram e significa adotar os valores do conquistador[3]

Concluindo, sempre será uma tarefa complexa prever o futuro de alguma coisa. O mundo dá muitas voltas; e o que defendemos hoje como certo pode futuramente ser visto como equivocado. Mas se as religiões quiserem sobreviver no futuro terão que fazer muito mais, além de defenderem somente os seus dogmas.    





[1] Robert Crawford. O que é Religião? Ed. Vozes, p. 222.
[2] Robert Crawford. O que é Religião? Ed. Vozes, p. 223.
[3] Robert Crawford. O que é Religião? Ed. Vozes, p. 234.



18 de outubro de 2017

DIVISÕES INTERNAS NAS RELIGIÕES - Um tema para o Ensino Religioso.


Você já parou para pensar o porquê das religiões se dividirem? Quais são os motivos que fazem com que os fiéis de uma mesma religião se desentendam e com isso criem conflitos e divisões? Há vários fatores que podem contribuir para que isso aconteça. Um deles pode ser que logo após a morte do fundador os seus seguidores; depois de algum tempo, comecem a disputar entre si a liderança e o poder da religião, criando com isso várias ramificações.

Outro fator muito comum é a discordância no entendimento e interpretação dos textos sagrados. Um indivíduo pode alegar que possui a interpretação mais correta de um determinado texto; e com isso querer impor o seu ponto de vista sobre as outras pessoas do grupo religioso. Esse tipo de discórdia é muito comum em religiões letradas, isto é, que fundamentam seus dogmas em algum livro sagrado.  

Acredito que você já tenha ouvido alguma vez em sua vida aquele ditado popular que diz “cada cabeça é um mundo diferente”. Pois bem, nem tudo é paz e harmonia no mundo místico das religiões. Há momentos em que os religiosos se dividem internamente, criando pequenas seitas dentro de uma grande religião.

O objetivo deste texto é mostra, resumidamente, às  várias divisões internas que existem em algumas religiões. Dar-se-á mais atenção a quatro grandes religiões mundiais: O hinduísmo, o budismo, o Islamismo e o judaísmo.   


HINDUÍSMO.
A fé hindu é bem diversificada. Isso significa que as pessoas podem praticar à religião de modos diferentes. Tudo dependerá da divindade à qual se oferece devoção. Mas também existem vários movimentos com raízes no hinduísmo. 

1. Vaisnavas e Saivitas – Os vaisnavas são os devotos de Visnu, que é uma das divindades mais populares do hinduísmo. Ele é conhecido como protetor e sustentador do universo. Segundo Wilkinson (2011, p. 178), “Visnu é a divindade que dá vida ao criador, Brama, que se senta numa flor de lótus no umbigo de Visnu, que também sustenta e protege tudo o que é criado por Brama”.

Os saivitas são os devotos de Xiva conhecido como “o destruidor”. Xiva é o deus dos “opostos”, ele cria e recria o universo, como também da vida e a tira. Muito provavelmente é essa característica que faz como que Xiva seja tão admirado por seus devotos. 
“Essa capacidade de reunir opostos é um dos aspectos de Xiva que fascina os saivitas. A conciliação de qualidades diversas por divindades superiores é fundamental no hinduísmo, e Xiva encarna essa reunião de opostos como nenhum outro deus. Não surpreende que seus devotos o vejam como deus supremo” (WILKINSON, 2011, p. 178).
Se existe algo de fascinante no estudo das religiões é a possibilidade de encontrar “pontos comuns” entre elas. É possível perceber que no hinduísmo existe a devoção a “três divindades populares”, que são Brama, Visnu e Xiva. No cristianismo existe a crença em um único Deus, mas que em “essência” ele é Pai, Filho e Espírito Santo. Mas não se pretende afirmar que o cristianismo e o hinduísmo sejam iguais. E realmente não são. Apenas que ambos possuem um ponto em comum. 

2. O movimento Hare Krishna – Esse movimento religioso foi fundado em 1965 nos EUA por um indiano conhecido pelo nome de Bhakti-vedanta Prabhupada. O objetivo do movimento é propagar por todo o mundo a religiosidade hindu tendo Krishna com divindade suprema.

Todos os devotos desse movimento são vegetarianos. Eles não comem carne, peixe ou ovos. Procuram ter uma vida simples, abstendo-se de drogas, álcool e café. E são facilmente identificados pela cabeça raspada e por vestirem um manto alaranjado.  

“Os Hare Krishna consideram o mundo exterior naturalista e desprezível. Esse movimento – para alguns seita – se apoia nos textos sagrados dos Vedas, principalmente nos Upanixades e no Bhagavad-Gita, sem perder de vista também a extraordinária mitologia do hinduísmo” (Dicionário histórico de religiões, p. 180).

3. Igreja de Saiva Siddhanta – Conhecida como “Sagrada Congregação da Verdade Revelada do Deus Supremo Xiva”, essa igreja foi fundada em 1949 nos EUA pelo mestre Satguru Shivaya Subremuniyaswami, mais conhecido como Gurudeva. Segundo Wilkinson (2011, p. 180),
“Gurudeva tornou-se respeitado na comunidade hindu como uma das pessoas que mais fizeram para disseminar o conhecimento da religião fora da Índia. A variedade de hinduísmo que ele difundiu foi fortemente influenciada pela dos saivitas do Sri Lanka. Os adeptos se dedicam ao serviço comunitário, ao culto de Xiva, à ioga e à meditação, na esperança de se aproximar do deus e alcançar mocsa[1]. Seus valores incluem o vegetarianismo e a não violência”.
Essas são apenas algumas divisões que existem dentro do hinduísmo; muito provavelmente existem outras, porém, as que aqui foram citadas mostram que a crença nas divindades é o principal elo de ligação entre todas as divisões do hinduísmo.  


BUDISMO.
O budismo possui várias divisões, e elas podem se diferenciar em alguns aspectos; contudo todas as formas de budismo compartilham o mesmo compromisso com os ensinos do mestre Buda.

1. Budismo teravada – É o ramo do budismo praticado exclusivamente pelos monges e monjas. E é o que mais se aproxima dos ensinamentos originais de Buda. É muito influente na Tailândia, Laos e no Camboja. O teravada enfatiza a importância da sangha ou comunidade. Os monges passam a maior parte do tempo nos mosteiros praticando meditações diárias, vivendo de modo simples e com poucos bens materiais.

2. Budismo maaiana – Esse ramo budista surgiu logo após a morte de Buda, e tem alguns pontos de vista diferentes do budismo teravada. Enquanto este é restrito aos monges, aquele é aberto aos leigos. Ou seja, o maaina amplia o conceito de comunidade tornando-a acessível aos leigos.

Outra diferença entre o teravada e o maaiana é a visão que se tem do Buda. O primeiro crê que o Buda é apenas um “exemplo a ser seguido”, logo após a sua morte ele deixou de existir deixando apenas os seus ensinos. Mas o segundo crê que o Buda continua vivo e deve ser cultuado.
 “Os maaianas creem que o Buda sobrevive, e que devem cultuá-lo. Creem ainda que outros seres também se podem tornar Budas. Quando uma pessoa perde a individualidade, o que resta é uma espécie de essência interior chamada natureza do Buda. Os budistas maaianas reconhecem diversos seres que alcançaram a budidade e são dignos de culto” (WILKINSON, 2011, p. 201).
3. Zen budismo – “Segundo o zen, todos são um Buda, mas nem todos realizaram a sua budidade potencial ou tomaram consciência dela. Ademais, todos nós temos uma identidade única que une não só todos, mas todas as coisas” (WILKINSON, 2011, p. 202).

Essa é uma forma de budismo chinês que com o passar do tempo se fixou no Japão em meados do século XII. Uma das características do zen budismo é ser rigoroso em questões de meditação e comportamento. Outra é a criação de jardins minimalistas e a composição de poesias.


4. Budismo tibetano – Esse ramo do budismo foi implantado no Tibete pelo rei Songten Gampo em meados do século VII d.C. Segundo Wilkinson, alguns relatos dizem que o rei Gampo construiu templos budistas e também ordenou a criação de um alfabeto tibetano que possibilitou os eruditos a traduzirem os textos budistas para à escrita tibetana. Em outras palavras, o poder político contribuiu para que o budismo se estabelecesse no Tibete, e ao mesmo tempo fez algumas mudanças na religião. 

Um aspecto do budismo tibetano (e que o diferencia das outras correntes budistas) é o uso das mandalas que são uma espécie de diagramas simbólicos, que segundo à crença tibetana, representam o corpo, os ensinamentos e a mente do Buda. A confecção de uma mandala já é em si uma prática de meditação.

No budismo tibetano um personagem muito respeitado e reverenciado é o Lama. Ele é um monge erudito que para alcançar o título de lama teve que passar por rigorosa formação. Acredita-se que os lamas foram, em vidas passadas, grandes líderes espirituais. 
“Quando o fim de sua vida se aproxima, um lama dá uma série de pistas para a identificação de sua próxima encarnação. Então seus adeptos buscam, até encontrar, a criança que melhor corresponda às pistas, e começam a treiná-la como líder espiritual também. O lama de mais renome internacional é Dalai Lama, chefe dos gelugpa e embaixador da fé no mundo inteiro” (WILKINSON, 2011, p. 2014)
ISLAMISMO.
Há algumas hipóteses que dizem que em alguns anos o Islamismo tornar-se-á a maior religião do mundo; e com isso, ultrapassando o cristianismo no número de seguidores. Basicamente dentro do Islamismo existem três divisões que são: sunismo, xiismo e sufismo. Conheçamos cada uma delas resumidamente.

1. Sunismo – A maioria da população muçulmana é sunita, o que pode representar mais de oitenta por cento do mundo muçulmano. Um sunita é um fiel seguidor da “Suna do Profeta”, ou seja, o sunita é um imitador do comportamento de Maomé. Para essa corrente do islamismo o comportamento do profeta Maomé é tão importante como o Corão.

Nas palavras de Wilkinson (2011, p. 144), “Todo muçulmano sunita segue uma das quatros escolas de jurisprudência – Malaki, Hanafi, Hanbali e Shafi´i -, que variam no modo como usam o consenso e a razão para suplementar o Corão. As pessoas são livres para escolher a que escola aderir, mas a maioria dos sunitas tende a adotar a mesma do pai”.

2. Xiismo – Os muçulmanos xiitas são os partidários de Ali, que foi primo de Maomé e marido de Fátima uma das filhas do profeta. Os xiitas surgiram a partir de uma discórdia sobre quem deveria ser o sucessor de Maomé.

Os sunitas seguiam a Abu Bark (que segundo os sunitas, tinha sido escolhido pelo próprio Profeta), os xiitas não concordavam com essa escolha; para eles somente alguém que fizesse diretamente parte da família de Maomé deveria ser o sucessor, e neste caso, Ali seria o mais indicado.
“Os sunitas são maioria entre os muçulmanos, mas os xiitas sempre foram proeminentes e hoje constituem a maioria no Irã e no Iêmen e a maior minoria no Iraque. Adotam os cinco pilares como os sunitas, mas divergem deles ao acrescentar ao primeiro pilar – Há um só Deus e Muhammad é seu profeta – as palavras: “E Ali é o vice regente de Deus” (CRAWFORD, 2005, p. 116).
3. Sufismo – O sufismo é a corrente “mística” do Islamismo, seus adeptos são conhecidos como os “sufis”. A principal diferença desta corrente islâmica em relação as outras, é que os sufis dão mais importância à experiência pessoal com Alá do que o legalismo e à ortodoxia.

“Uma terceira divisão na fé muçulmana é o sufismo, que são os místicos. O nome significa “lã” e era aplicado aos ascetas que usavam lã sobre a pele. Reagiam contra o legalismo islâmico, o mundanismo dos muçulmanos gananciosos, e procuravam a união com Alá através de práticas semelhantes das religiões indianas. [...]. Muitos se converteram ao sufismo por causa do zelo missionário de seus adeptos. Alguns afirmavam ter chegado à união completa com Alá, coisa que os sunitas consideravam uma blasfêmia e por isso os puniam ou executavam” (CRAWFORD, 2005, p. 118).

Para os sufis o profeta Maomé foi um grande místico; pois ele teve profundas experiências com Alá, e foi na solidão que ele recebeu as revelações que depois tornar-se-iam o sagrado Corão. E diferente das outras correntes do Islamismo, o sufismo acredita em um Deus amoroso e procura fazer uma interpretação mística dos textos do Corão. 


JUDAÍSMO
Existem algumas ramificações no judaísmo que poucos conhecem, e cada uma delas se diferencia no modo como a Torá é entendida e interpretada.

1. Judaísmo ortodoxo – Os ortodoxos são os fiéis preservadores da tradição judaica e da Torá. O Judaísmo ortodoxo é a religião oficial do Estado de Israel. E é caracteristicamente rigoroso na obediência à Tora e na conservação da identidade do povo judeu.

Nas palavras de Wilkinson (2011, p. 80), “Os judeus ortodoxos procuram viver segundo as instruções da Torá. O texto influi no modo como se vestem, no que comem, em sua vida familiar e nas leis da herança. [...]. Em séculos passados, na Europa, esses judeus se viram excluídos do resto da sociedade. Hoje, ainda resistentes a mudanças, seu modo de vida contrasta com os dos não judeus e o de outros judeus à sua volta, mas eles optam por permanecer separados para viver em conformidade com a lei de Deus”.

Podemos ver que ao preservarem às características de suas tradições religiosas, os ortodoxos buscam preservar a sua própria identidade. Sabe-se que durante a história, os judeus foram muito perseguidos e escravizados por outros povos. E uma das causas que fizeram com que eles não perdessem a sua identidade foi a conservação de sua fé e religião.

É possível constatar que o lado positivo do conservadorismo religioso é ser um meio de não permitir que a cultura, fé e a religião de um povo sejam destruídos. Se o povo judeu ainda existe hoje é porque souberam conservar e lutar por sua fé e religião.   

2. Judaísmo da Reforma ou progressista -  Diferente dos judeus ortodoxos, os judeus da reforma ou progressistas tentam adaptar a religião as mudanças que ocorrem na sociedade. Essa divisão do judaísmo surgiu nos Estados Unidos, mais especificamente na cidade da Pitsburgh na Pensilvânia no século XIX.

Os progressistas são mais liberais em questões de religião do que os ortodoxos. “Eles tendem a ver a Torá não como as palavras de Deus, mas como obra de diferentes autores que podem ter sido inspirados por ele. Abandonaram muitas das antigas leis dietéticas e adotaram novos costumes, como a ordenação de mulheres como rabinos. Aboliram também algumas partes antiquadas da liturgia, como a oração pela restauração do sacrifício animal no Templo” (WILKINSON, 2011, p. 82).

Acredito que nem sempre querer adaptar as crenças religiosas as mudanças que acontecem na sociedade pode ser algo positivo. Por que isso, de certa forma, pode causar a “descaracterização da religião”, ou seja, cria-se uma religião diferente da antiga. Ela pode até tomar emprestado alguns elementos da antiga religião, mas não será igual a ela.

Conclusão.
As religiões são fascinantes e ao mesmo tempo contraditórias. Existem pontos de convergência e divergência em todas as religiões. Podemos até dizer que elas são o reflexo dos próprios religiosos. Ou seja, indivíduos obcecados pelo Ser divino, mas por não o compreender muito bem, acabam se desentendendo e criando divisões entre si.


Fontes:
AZEVEDO, Antonio Carlos do Amaral. Dicionário Histórico de Religiões. Rio de Janeiro. Nova fronteira, 2002.
CRAWFORD, Robert. O que é Religião? Rio de Janeiro. Vozes, 2005.
WILKINSON, Philip. Religiões: guia ilustrado Zahar. Rio de Janeiro. Zahar, 2011.




[1] Resumidamente o mocsa é a libertação do repetitivo ciclo de reencarnações. Todo devoto hindu procura atingir esse estado de espírito. Há vários caminhos que podem levar a esse estado. Um deles é uma vida dedicada a meditação sob a orientação de um mestre ou guru. Outro é a prática do altruísmo, procurando fazer boas ações no mundo. No entanto, isso não garante que este estado de espírito seja alcançado.