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15 de outubro de 2019

O QUE DEFINE UMA RELIGIÃO? | Frank Usarski

13 de agosto de 2019

RELIGIÃO, POLÍTICA E SOCIEDADE NO BRASIL.

Foto: Rawpixel by Getty Images

Geralmente quando se fala em “laicidade”, “separação entre igreja e Estado” e “secularização” no Brasil, costuma-se olhar e imitar o modelo francês. Ou seja, os especialistas sejam eles sociólogos, historiadores ou cientistas políticos desejam que o Brasil siga os passos da França, no que tange a separação entre religião e Estado. No entanto, tendo em consideração o contexto histórico e cultura de cada país, não podemos garantir que o modelo francês seja o mais ideal para o Brasil. Um exemplo bem claro é que o fenômeno religioso no Brasil, diferente na França, está muito presente e vivo na vida dos brasileiros. Tudo mostra que a ideia de secularização que acontece na França e em outros países europeus não se encaixa no contexto brasileiro.

José Casanova (2006) “fala que a teoria tradicional de secularização pode funcionar muito bem em muitos países europeus, mas que essa teoria não é adequada para os Estados Unidos. E de modo semelhante o modelo americano funciona nos Estados Unidos, porém ele não serve para a Europa”. Tudo indica que com o passar do tempo a religião foi perdendo sua influência e sentido no dia a dia dos europeus, tanto que muitas igrejas protestantes históricas deixaram de funcionar. Mas isso não acontece nos Estados Unidos, muitos americanos continuam sendo religiosos e frequentando os espaços sagrados.

No Brasil a situação é bem diferente, existe uma diversidade religiosa muito grande no território brasileiro. O nativo (que é amparado pela constituição brasileira) tem a liberdade de escolher e seguir o credo religioso que mais lhe agrade. Catolicismo, protestantismo, pentecostalismo, espiritismo, maçonaria, umbanda, candomblé, budismo, ateísmo e agnosticismo são as várias opções que os nativos brasileiros tem a sua disposição. Mas sabe-se muito bem que essa diversidade pode gerar conflitos e intolerância religiosa. Por isso que é bom o Estado brasileiro não ter uma religião oficial. Ele deve ser neutro em questões religiosas e criar leis para garantir a liberdade religiosa e também punir os que queiram promover a intolerância religiosa e consequentemente a violência contra as minorias.

Historicamente o Brasil é um país católico, essa conjuntura começou durante o período colonial e imperial. Mas com o advento do período republicano – muito influenciado pelas ideias do iluminismo e do positivismo – a hegemonia do cristianismo católico começou a perder força e abriu-se espaço para a inclusão de religiões não católicas que começaram, aos poucos, conquistar espaço nos vários setores da sociedade brasileira.

Na atualidade o seguimento evangélico (pentecostal/neopentecostal) tem conquistado muito espaço principalmente na esfera política. Para os secularistas as religiões não deveriam ter espaço na política, porque isso pode ferir o conceito de Estado laico. Mas se olharmos a ideia de democracia na qual as diferentes cosmovisões deve conviver juntas e se respeitarem mutualmente, não seria uma atitude antidemocrática excluir as religiões da esfera pública? Na realidade é saudável que os religiosos participem e se envolvam em todas as áreas da vida pública. O desafio é não permitir que as crenças religiosas particulares se transformem em uma espécie de “modelo” que toda a população seja obrigada a seguir e crer.
Não consigo encontrar uma razão convincente, em termos democráticos ou liberais, para banir, em princípio, a religião da esfera pública democrática. Pode-se, no máximo, em bases históricas pragmáticas, defender a necessidade de separação entre “igreja” e “Estado”, embora eu não esteja mais convencido de que a separação completa seja uma condição necessária ou suficiente para a democracia. A tentativa de estabelecer uma parede de separação entre “religião” e “politica” é injustificada e provavelmente contraproducente para a própria democracia (CASANOVA, 2006, p. 16).
        No caso do Brasil é notório que existe uma forte influência cristã (evangélica) em vários setores da sociedade, mais especificamente na política. O problema é que essa influência cristã se torne dominante e impeça que outros seguimentos religiosos tenham uma parcela de participação na esfera pública, gerando com isso um clima de intolerância religiosa. 

Podemos entender que o conceito "laicidade" e "secularização" no Brasil não impedem que as religiões sejam atuantes na esfera pública. O desafio é não permitir que um determinado seguimento religioso se torne hegemônico e queira implantar na sociedade a sua visão de mundo religiosa. Ou seja, Estado e religião podem conviver juntos desde que cada um não interfira na esfera de atuação do outro.

Infelizmente nem todos compreendem isso. Em quase todas as religiões existem grupos radicais minoritários fundamentalistas que desejam a todo custo que a sociedade seja “convertida” ao seu estilo de vida religioso. Um exemplo muito claro no Brasil são as atitudes de intolerância religiosa de grupos pertencentes as Igrejas evangélicas neopentecostais que discriminam e atacam fieis de religiões de matriz africana (candomblé/umbanda), e geralmente isso acontece por causa da associação que os neopentecostais fazem das entidades espirituais das religiões africanas, os orixás, com demônios e espíritos do mal. Criando com isso uma espécie de arena de guerra na sociedade brasileira.
Alguns exemplos destes casos de vilipendio religioso foram a depredação de um centro de Umbanda no bairro de Catete no Rio, por 4 evangélicos; a ação do pastor Tupirani e de um membro da “Igreja Geração de Jesus Cristo” de postar vídeos na internet insultando às religiões afro-brasileiras e à ordem legal protetora da liberdade religiosa, como o tema veiculado “Bíblia sim, Constituição não”; assim como, a desqualificação da Lei Caó (que torna o racismo como crime inafiançável) retratada como “Lei Caô (gíria que significa mentira) (MIRANDA, 2010, p. 135 apud CAMURÇA, 2017, p. 877).
         Acreditar que a intolerância e o preconceito religioso serão algum dia erradicados na sociedade brasileira é uma grande utopia. No mínimo o que sociedade organizada poder fazer, através do poder público, é diminuir essa tendência incentivando a educação de jovens e adultos sobre a importância de respeitar os que possuem crenças diferentes. O bem comum não pode ser algo de pertencimento exclusivo de um determinado grupo religioso, mas deve abranger todas as pessoas que juntas constituem a sociedade brasileira.

        O Brasil possui um diversidade religiosa que talvez não exista em outros países. E isso nos faz pensar que não é muito apropriado implantar no Brasil um modelo de laicidade francês ou de outro país europeu. É importante pensar o Brasil pelo Brasil, e não por algum país estrangeiro.



FONTES.
CAMURÇA, Marcelo Ayres. A questão da laicidade no Brasil: mosaico de configurações e arena de controvérsias. Horizontes, Belo Horizonte, v. 15, n. 47, p. 855-886, jul./set. 2017.
CASANOVA, José. Rethinking secularization: a global comparative perspective. The Hedgehog Review, Charlottesville (EUA), v. 8, n. 1 e 2, p. 7-22, jan./dez. 2006.

21 de agosto de 2018

UMA BREVE INTRODUÇÃO AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO.


Para início de conversa é bom saber que Ciências da Religião e Teologia não são a mesma coisa. São áreas de conhecimento distintas, com objetos de pesquisa distintos, no entanto, que podem se complementar. Uma diferença entre as duas é que a teologia (e aqui não vou explicar os vários tipos de teologias que existem, mas por uma questão de simplificação, me referirei a teologia dogmática cristã) é mais antiga, e as Ciências da Religião sendo mais nova, surgindo a partir do século XIX.
“Ciência da religião (conforme nomenclatura empregada pela CAPES) é área de estudo acadêmico da religião surgida em fins do século XIX, que inclui a descrição, a interpretação, a comparação e a explicação de ideias, textos, comportamentos e instituições, linguagens (símbolo, mitos, rito e doutrina) e práticas das mais variadas tradições religiosas, como também a reflexão em torno dos conceitos que cada âmbito desses mobiliza, sem pressupor a superioridade de uma tradição religiosa sobre outra” (PIPER, 2017, p. 131)
O objeto de estudo da teologia é Deus e suas manifestações no mundo, mas o das ciências da religião é o fenômeno religioso humano. Outra diferença entre essas duas áreas de conhecimento é que a teologia busca fortalecer à crença pessoal do teólogo, enquanto, as Ciências da Religião não têm a intenção de fortalecer a fé de ninguém, mas tentar compreender de uma forma cientifica e imparcial a religião do outro.

Os pais fundadores da ciência da religião foram todos europeus, em sua maioria alemães, holandeses, romenos e italianos. Entre eles estão: Friedrich Max Müller (1823-1900), Cornelis Tiele (1830-1902), Rudolf Otto (1869-1937), Gerardus Van der Leeuw (1890-1950), Joachim Wach (1898-1955), Raffaele Petazzoni (1883-1959), Mircea Eliade (1907-1986), Wilfred Cantwell Smith (1916-2000), Donald Wiebe (1943-), Roderick Ninian Smart (1927-2001) e Michael Pye (1939-). Todos eles tiveram a curiosidade de conhecer de uma forma mais cientifica o fenômeno religioso.
Portanto a análise da religião deve ser feita de modo imparcial, não cabendo ao estudioso interferência prática. Ele deve apenas descobrir o que é a religião, qual é a fundamentação que ela possui na alma humana e quais são as leis de seu desenvolvimento histórico. E, partindo de uma base linguística, desenvolver estudos comparativos das diversas mitologias. Dessa maneira para ele, “uma Ciência da Religião, baseada na comparação verdadeiramente cientifica e imparcial de todas [...] religiões da humanidade, é agora uma questão de tempo” (Müller, 1893, 26). (PIPER, 2017, p. 134).
Logo no início o método usado por Max Müller para analisar as religiões foi a linguística. Müller traduzia os mitos e textos sagrados e os comparava uns com os outros. No entanto, com o passar do tempo outros métodos de pesquisa foram sendo usados. Por exemplo, Gerardus Van der Leeuw usou à fenomenologia como método cientifico para estudar a religião, mas à abordagem fenomenológica foi posteriormente criticada por outros cientistas da religião. Mas isso faz parte do processo. Toda e qualquer nova área de conhecimento precisa ser críticada e questionada para saber se seus métodos são legítimos e concretos.      

Mas por que o nome “Ciências” da Religião no plural? Isso se deve por ser uma área de conhecimento pluridisciplinar, ou seja, existem outras disciplinas dentro das Ciências da Religião. São elas: filosofia da religião, história da religião, sociologia da religião, antropologia da religião, psicologia da religião e geografia da religião. Tudo isso para tentar compreender à religião de uma forma mais cientifica, e isso faz com que as Ciências da Religião seja aberta ao diálogo com outras áreas do conhecimento humano. E, este é outro aspecto que faz com que as Ciências da Religião não seja confundida com à teologia dogmática.

No Brasil as Ciências da Religião, como uma área de estudo acadêmica, para conseguir algum espaço nas universidades brasileiras teve ajuda da Teologia da libertação. Essa corrente teológica faz uma interpretação marxista da Bíblia, e por isso foi mais aberta ao diálogo com as ciências humanas, proporcionando assim um terreno fértil para a inclusão das Ciências da Religião no solo acadêmico brasileiro.

Hoje algumas universidades públicas e particulares oferecem cursos de graduação e pós-graduação com o objetivo de formar pesquisadores e professores em Ciências da Religião. 

E aí caro leito, gostou do texto? Deixe um comentário.


Fonte:
PIPER, Frederico. Ciência(s) da(s) Religião(ões). In: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; BRANDENBURG, Laude Erani; KLEIN, Remí. (Org.) Compêndio do ensino religioso. São Leopoldo: Sinodal, 2017.

19 de dezembro de 2016

RESUMO: "O MISTICISMO APOCALÍPTICO DO APÓSTOLO PAULO".

Algo novo sobre Paulo, é o que o Dr. Jonas Machado em seu livro "O misticismo apocalíptico do apóstolo Paulo" traz para os leitores brasileiros. Tudo o que até hoje foi escrito sobre o apóstolos dos gentios, sempre ficou reduzido ao âmbito teológico confessional, e isso tem criado um tipo de conhecimento limitado, e pior de tudo, repetitivo. Não desprezando a teologia, Jonas Machado segue por outro viés, que é o da experiência religiosa de Paulo. Na introdução da obra, Jonas Machado diz qual é o objetivo da pesquisa.
"Portanto, o conteúdo deste livro tem como foco a experiência religiosa em contraste com o sentido mais racionalista de "teologia" devido ao caso em questão, ao mesmo tempo em que reconhecemos que não é possível separar totalmente as duas dimensões. Assim, a expressão "misticismo apocalíptico" coloca em mente em primeiro plano a experiencia religiosa, e não a teologia, como também indica o subtítulo do livro" (p. 20).
O autor reconhece que é uma tarefa difícil tentar resgatar a experiência religiosa de Paulo. No entanto, há fontes que fazem com que o trabalho não seja impossível. Uma das fontes são as cartas de Paulo aos coríntios, onde Paulo deixou registrados alguns aspectos de suas experiências misticas. Para poder recuperar o contexto religioso do tempo de Paulo, Jonas Machado faz uso também da Bíblia Hebraica, da Septuaginta, Apócrifos e Pseudepígrafos, e os Manuscritos do mar morto da seita de Qumram

Neste post farei apenas um resumo sucinto dos capítulos dessa obra tão importante, que vem contribuir para um entendimento mais amplo sobre Paulo e sua experiência religiosa. O leitor interessado poderá usar esse resumo apenas como um ponto de partida, caso queira adquirir a obra e lê-la. 

Paulo de Tarso foi um "judeu místico-apocalíptico", e é isso que Jonas Machado quer mostrar em sua obra. No capítulo que tem como título "o contexto religioso de Paulo", o autor tenta adentrar no ambiente religioso onde Paulo viveu e saber quais foram os paradigmas, que supostamente, deram base a sua experiência religiosa. No decorrer da leitura fica muito nítido como é difícil para um pesquisador resgatar traços da religiosidade paulina do I século.
"A questão, entretanto, é que a experiência religiosa, mesmo que difícil de pesquisar, não é apenas mais um elemento, mas um aspecto determinante para a compreensão do fenômeno religioso paulino" (p. 63). 
Neste capítulo o autor mostra a diferença entre "Apocalíptica", "Apocalipsismo" e "Apocalipse".
Apocalíptica seria uma perspectiva religiosa ou uma forma de ver os planos divinos em relação com realidades mundanas ou terrenas. Apocalipsismo seria o universo simbólico em que está inserido o movimento apocalíptico. Este procura construir uma nova ordem no lugar da presente ordem da sociedade dominante. Apocalipse seria um gênero literário (p.74).
Paulo está ligado ao terceiro aspecto. Ele como filho do seu tempo foi muito influenciado pela literatura apocalíptica, e em algumas de suas cartas (em destaque aos coríntios) deixar isso muito claro. E para melhor fundamentar usa tese, Machado faz uso de livros apócrifos como 1Henoc, 2Henoc, Manuscritos do mar morto, A ascensão de Isaías e o Apocalipse de Sofonias. Mas o que há de importante nesses livros que foram considerados "heréticos" pela comunidade judaica e cristã? A resposta é que eles fazem parte do mesmo gênero literário de algumas cartas de Paulo, que nesse caso é a apocalíptica. E por isso eles podem ajudar na tentativa de compreender as influências místico-religiosas que influenciaram Paulo na composição de suas cartas aos coríntios. Em suma, nem tudo o que está escrito nos apócrifos e pseudepígrafos pode ser descartado!

A parte mais importante da obra é o capítulo que tem como título "Paulo e os coríntios". É aqui onde o autor desenvolve toda a sua tese sobre a experiência religiosa de Paulo. Na verdade esse capítulo é uma exegese das cartas de Paulo aos cristãos da cidade de corinto. Jonas Machado traz uma nova metodologia à luz da experiência religiosa. 


Nas palavras de Machado: "à um crescente reconhecimento de que é impróprio partir de Atos para Paulo para estabelecer a carreira dele" (p.153). Atos dos apóstolos foi escrito por Lucas, que segundo a tradição, foi cooperador de Paulo, e com isso proporcionando um conhecimento de "segunda mão" sobre Paulo. Para entender Paulo e suas experiências místicas-apocalípticas é necessário ir primeiramente na fonte, que nesse caso são as suas cartas. Ou seja, o caminho certo é olhar o testemunho do próprio Paulo, para depois ir até as narrativas de Atos. E nesse caso as cartas aos corintios são o foco da análise.

Machado analisa exegeticamente passagens como 2Co 12:1-10, para provar que o arrebatamento de Paulo era um padrão em sua vida, isto é, que essa experiência mística de ser transportado em espírito aos céus foi uma característica dos antigos místicos judeus do passado, e que isso não ocorreu uma única vez na vida Paulo, mas provavelmente outras vezes.
"Nesse testemunho paulino existem evidências suficientes de uma linguagem tradicional da apocalíptica judaica. Os termos e expressões "visões e revelações", "ser arrebatado", "terceiro céu", "paraíso" e até mesmo "fraqueza", "perseguição", "angústia" e "anjo de Satanás" são típicos e revelam um campo semântico apocalíptico. Esse relato visionário é único e breve, mas ele mostra o quanto Paulo depende de conceitos até mesmo de práticas litúrgicas apocalípticas que ele mesmo experimentou, concebeu e adaptou à sua carreira como apóstolo de Jesus Cristo" (p. 166).
Infelizmente à teologia dogmática racionalista é muito incompetente para ver esse lado místico-apocalíptico de Paulo. Em muitas situações os cristãos acabam tendo uma visão errada sobre quem foi realmente Paulo e quais foram as experiências que ele teve com Deus. 

A obra de Jonas Machado, ao meu ver, procura trazer de volta para a mesa de discussão algo que teologia dogmática jogou fora, que a experiência religiosa dos primeiros cristãos, e nessa caso as experiências de um dos personagens mais importantes na história do cristianismo, Paulo de Tarso. 


Sobre o autor: Jonas Machado, pastor batista, doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e mestre em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo, é especialista em história e literatura do cristianismo primitivo.