7 de novembro de 2018

O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA.

A presença do Ensino Religioso na grade curricular das escolas públicas ainda é motivo de polêmica na sociedade brasileira. Para uns o ER (Ensino Religioso) é de responsabilidade da família, e por isso a escola deve ser isenta desse tipo de ensino. E ainda afirmam que à presença do ER nas escolas vai contra à laicidade do Estado. Para outros que defendem a permanência do ER nas escolas, argumentam que as religiões são fontes de espiritualidade e ética, e elas podem contribuir com a formação dos alunos e ajudá-los a terem uma visão mais ampla sobre as diferentes fés e culturas.

O ER contemporâneo deve ser pautado na diversidade religiosa que existe na cultura brasileira, isto é, ensinar que não existe apenas uma única religião, mas várias, e cabe ao indivíduo seguir (ou não) a expressão religiosa que mais lhe agrade. Mas reconhecemos que essa polêmica está longe de terminar.

Em 2017 o STF (Supremo Tribunal Federal) tomou uma decisão que colocou mais fogo na polêmica sobre o ER. Segundo eles o ER nas escolas públicas deve ser “confessional”, e segundo eles, isso não fere a laicidade do Estado brasileiro. Veja este link: Decisão do STF sobre o Ensino Religioso. O ER confessional dá privilégio a uma determinada religião em detrimento das outras. Neste caso, o cristianismo de matriz Católica Apostólica Romana é o que recebe maior atenção.

Podemos supor que essa decisão foi tomada por causa da forte influência cristã católica que diretamente contribuiu com a formação religiosa do povo brasileiro. Respeito à decisão do STF, mas também discordo dela. Defendo que o ER nas escolas deve ter como objeto de estudo à diversidade religiosa que existe em nosso país. O brasileiro não é somente católico, mas também protestante, espirita, hindu, taoista, maçom, agnóstico, etc. 

O presente texto tem basicamente dois objetivos: 1. Mostrar resumidamente a trajetória do ER na legislação brasileira; 2. Defender que o ER é importante para a formação religiosa, ética e cultural dos alunos.

I. O TRANSCURSO DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL.
Os primeiros passos da implantação do ER no território brasileiro começaram com o trabalho de evangelização dos jesuítas. O ER era de caráter catequético confessional, ou seja, ele tinha o objetivo de educar e conquistar seguidores para a fé cristã católica. Torres (2012, p. 23) confirma esse fato ao dizer que: 
“O Ensino religioso no Brasil tem início com a colonização, de modo especial, com a chegada dos Jesuítas, em 1549, os quais consideramos como os primeiros catequizadores e a quem foi confiada à educação nas novas terras. Nos quatro primeiros séculos de sua história, o Brasil foi um país oficialmente católico. ”  
Mas desde a chegada dos jesuítas até os nossos dias contemporâneos, já se passaram quase cinco séculos, e as coisas mudaram bastante. Além da fé católica tradicional, os brasileiros tiveram contato com outras manifestações de fé. Hoje o brasileiro não só católico, ele pode muito bem escolher outra fé que lhe satisfaça. Com isso o Brasil passa por uma metamorfose religiosa, abre-se espaço para o “pluralismo religioso”, no qual uma ampla variedade de crenças religiosas está à disposição do gosto de cada brasileiro.

Foi no período republicano de 1889 a 1988 que a presença do ER como disciplina nas escolas passou a ser um tema polêmico e acalorado. Nas palavras de Torres (2012, p. 25):
“A implantação do regime republicano provoca, desde início, um aferrado debate sobre o Ensino Religioso no Brasil. Pode-se considerar como sendo a mais polemica das discussões sobre a inclusão ou exclusão dessa disciplina nas escolas da rede pública oficial. ”
O período republicano foi muito influenciado pelas ideias do iluminismo e do positivismo. E isso foi tão forte que a frase ORDEM E PROGRESSO que existe da bandeira brasileira é de origem positivista. De forma resumida podemos dizer que o iluminismo defende que tudo o que existe no mundo deve ser compreendido somente pela razão humana, qualquer fato que não possa ser compreendido pela razão deve ser visto como mera superstição. O positivismo foi uma corrente de pensamento que surgiu na França no século XIX, e teve como fundador Augusto Comte. O positivismo defende que tudo no mundo deve passar pelo crivo do conhecimento cientifico, sendo ele é único conhecimento verdadeiro.

Nesse período várias pessoas defendiam que o ER não deveria fazer parte da educação básica. Um dos argumentos era que a presença do ER nas escolas públicas feriria a laicidade do Estado, e por isso, não caberia ao governo oferecer esse tipo de ensino. Mas a Igreja Católica (que sempre teve muita influência na política brasileira), sem dúvida iria lutar para que ER continuasse fazendo parte da grade curricular nas escolas. E com o passar do tempo outros grupos se engajaram na luta para que o ER continuasse fazendo parte da educação. 
“A inclusão do Ensino Religioso na Carta Magna de 1988 se deu graças a grande mobilização nacional dos professores, da sociedade em geral, liderados por Entidades e Organismos como a CNBB[1], ASSINTEC[2], AEC[3] e outros. É notável salientar a atuação de diferentes denominações religiosas na defesa do Ensino Religioso; o que antes se fazia somente mediante liderança da Igreja Católica” (TORRES, 2012, p. 31).
Legalmente o ER faz parte da educação básica no Brasil, mas uma pergunta que deve ser feita é: que tipo de ER deve ser aplicado nas escolas? Um ER que seja fundamento não na Teologia cristã confessional, mas nas Ciências da Religião. Mas teologia e ciência da religião não são a mesma coisa?  Não, pois qualquer teologia confessional vai defender uma religião em particular, e isso foi o que os Jesuítas fizeram na época da colonização. 

O ER contemporâneo deve ser fundamentado nas Ciências da Religião. Essa área de conhecimento (que surgiu no século XIX) não defende nenhuma religião em particular, pelo contrário, apenas estuda o fenômeno religioso de forma imparcial. E isso faz com que o ER não seja um instrumento de “evangelização”, mas de explicação sobre fenômeno religioso que existe no Brasil e em outros lugares do mundo.


II. O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA.
A escola, através dos professores, tem a missão de ensinar e transmitir o conhecimento para os alunos, contribuindo com sua formação cidadã e ética. Língua portuguesa, matemática, história, geografia, ciências, artes e Ensino Religioso são disciplinas que fazem parte da grade curricular das escolas sejam elas públicas ou particulares, no entanto, com relação ao ER ainda existe muito preconceito por parte de diretores, coordenadores e professores sobre a presença desse tipo de ensino nas escolas.

Muito provavelmente é a influência do iluminismo e do positivismo na mentalidade brasileira que faz com que alguns profissionais da educação não vejam o ER com bons olhos. Mas quer gostem ou não o ER faz parte da educação brasileira, e mais, as religiões sempre estiveram presentes na vida dos brasileiros, então o conhecimento religioso é algo público e deve estar disponibilizado para todos os que tenham interesse.
“Todo o conhecimento humano tornar-se patrimônio da humanidade. A sua utilização, porém, depende de condições sociais e econômicas bem como das finalidades para as quais são utilizados. Nem todo conhecimento é de interesse de todos. Um conhecimento político ou religioso pode não interessar a um grupo, mas, uma vez produzido, é patrimônio humano e como tal deve estar disponível. O conhecimento religioso é um conhecimento disponível, e por isso, a Escola não pode recusar-se a socializa-lo” (PCNER, 2009, p. 35).
Como falamos logo no início o ER contemporâneo não deve ser confessional, mas sim, plural. Ou seja, deve valorizar a diversidade religiosa que existe na sociedade brasileira. Encontrar  pontos em comum entre as religiões, e tentar criar um clima de diálogo amigável entre elas é um dos objetivos do ER contemporâneo. 

Infelizmente durante a história da humanidade muitas guerras e tragédias foram feitas (e ainda nos dias atuais continuam) em nome da religião. Mas isso aconteceu por causa da arrogância e soberba de alguns religiosos fanáticos. Quando alguém pensa que a sua religião é única verdadeira e as outras são falsas, abre-se espaço para que a intolerância e o fundamentalismo se manifestem.
“A Escola tem a função de ajudar o educando a se libertar de estruturas opressoras que o impedem de progredir e avançar. Através da reflexão, educador e educando rompem com as prisões que os prendem à segurança ilusórias oferecidas por objetos, situações e autoridade não legitimas. Compreendem os limites do conhecimento e a finitude do ser humano. ” (PCNER, 2009, p. 42)
O ER contemporâneo pode ajudar os alunos a terem um entendimento mais amplo sobre suas próprias crenças pessoais e as dos outros. Algo que eles precisam saber é que todos os sistemas religiosos são humanos e imperfeitos, e mais, eles não possuem respostas prontas para todas as perguntas da humanidade. Perguntas simples e inquietantes como: Quem sou eu? De onde vim? Para onde vou? O ER contemporâneo vai explicar que cada religião tem respostas diferentes para essas perguntas.

Por exemplo, qual é a origem do universo? O cristianismo dará uma resposta, o budismo outra, o hinduísmo outra, o zoroastrismo outra, o ateísmo outra, etc. Com isso o educando aprenderá que podem existir várias respostas para uma única pergunta.

Concluindo, de tudo o que foi dito neste breve estudo fica comprovado que a presença do ER na educação brasileira é muito importante. O fenômeno religioso está muito presente na vida de milhares de pessoas, e seria muita falta de inteligência querer que este ensino seja excluído das escolas.   


Fontes:
FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais - Ensino Religioso. São Paulo, Mundo Mirim, 2009.
TORRES, Maria Augusta de Sousa. Ensino Religioso e literatura: um dialogo a partir do poema Morte e Vida Severina. Recife, FASA, 2012. 


[1] CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
[2] ASSINTEC – Associação Inter-religiosa de Educação de Curitiba.
[3] AEC – Associação de Escolas Católicas.