Contribuição

Pix: anderson.alvesbarbosa7@gmail.com

15 de outubro de 2018

UMA BREVE INTRODUÇÃO AO HINDUÍSMO.


Devoto faz preces matinais no Ganges, em Benares.
Afirma-se que a imersão nas águas sagradas do rio é um
importante ato de purificação espiritual.
O Hinduísmo é uma das tradições religiosas mais antigas do mundo, tem aproximadamente cinco mil anos de existência. Não se sabe com certeza quando o Hinduísmo surgiu (na verdade é praticamente perda de tempo tentar saber as origens de alguma religião), no mínimo o que existem são apenas hipóteses. Mas isso não tira o fascínio que essa antiga tradição religiosa exerce sobre os hindus e os não hindus. A Índia é um pais no qual o sagrado está em toda parte, e isso é uma grande oportunidade para se descobrir os “mistérios” que rondam este exótico lugar.

Willis (2007, p. 69) diz que: 
O Hinduísmo denota as tradições que se desenvolveram a partir da religião védica trazida a Índia pelos arianos. Uma ênfase inicial ao sacrifício animal acabou sendo substituída por oferendas vegetarianas, divindades femininas de tornaram mais importantes e a religião piedosa ficou popular. Vishnu, ou Shiva, é visto muitas vezes como a divindade suprema. Um conceito hindu característico é aquele de transmigração: o nascimento continuo em uma serie de vidas, até a pessoa alcançar a libertação final por meio de conhecimento, ações ou devoção.
Algo que deve estar fixado em nossas mentes é que não se pode compreender um povo descartando o seu “fator religioso”, e infelizmente essa tem sido a atitude de alguns historiadores, sociólogos, filósofos, etc. Muitas civilizações foram formadas a partir de alguma crença religiosa. Um exemplo muito claro disso é a própria cultura ocidental que teve uma grande contribuição do cristianismo em sua formação. E a Índia não fica fora dessa regra. Então para que se possa ter uma compreensão sensata de um povo é necessário conhecer o seu fator religioso, caso contrário a pesquisa será muito limitada e pueril.

Este artigo tem o objetivo de responder três perguntas: 1. Quais são as principais divindades que compõem a mitologia hindu? 2. O que é libertação e quais os caminhos para alcança-la? 3. O que é o sistema de castas e suas implicações na sociedade hindu?

OS DEUSES.
Deus macaco Hanumam, um
avatar de Shiva.
Antes de conhecermos algumas divindades que compõem a mitologia hindu, é interessante conhecer, de forma resumida, os três tipos de crenças que durante muitos séculos estiveram presentes no imaginário religioso da humanidade, são: o monoteísmo, politeísmo e o henoteísmo. O primeiro defende a existência de um único deus supremo e nega a existência de outros. O segundo, diferente do primeiro, acredita na existência de várias divindades. E o terceiro acredita da existência de um ser supremo, mas não nega a existência de outros. O hinduísmo se encaixa nesta terceira crença. Os hindus creem em um ser supremo (favorito), mas não negam a existência de outros. 


Narayanan (2007, p. 134), diz que: 
“Os hindus podem reconhecer muitas divindades, mas considerar que apenas uma é suprema; ou podem considerar todos os deuses e deusas iguais, mas adorar um que é o seu favorito. Contudo, a maioria acha que todas as divindades são manifestações de uma única. Para muitos, dizer que esse Deus é homem ou mulher, um ou muito, é limitá-lo, impor ao divino ideias humanas de sexo e número”.
Apenas para fazer uma pequena comparação. No cristianismo existe a crença na Santíssima Trindade, isto é, que o Deus verdadeiro é entendido como Pai, Filho e Espírito Santo. De modo semelhante, existe no hinduísmo a crença, não muito popular, no Trimurti que se compõem de três divindades principais: Brahma, Vishnu e Shiva.

Narayanan (2007, p. 136), diz que: 
Textos sagrados exprimem a ideia de uma trindade divina (Trimurti) de Brahma (o criador), Vishnu (o preservador) e Shiva (o destruidor), mas esse conceito nunca foi muito popular. Com o tempo, Brahma perdeu funções, e criação, preservação e destruição associaram-se em uma divindade, que pode ser Vishnu, Shiva ou Devi (a Deusa).
Existem milhares de divindades no hinduísmo, e seria praticamente impossível enumerá-las uma por uma em um simples artigo. Para uma melhor compreensão dos deuses do hindismo, veja este video: Conhecimentos da humanidade - Hinduísmo Vishnu e Shiva são duas principais dividades panteão hindu. Os devotos de Vishnu são chamados de vaishnavas, e os shaivas são os de Shiva. Cada um desses grupos tem o seu modo peculiar de devoção.


A LIBERTAÇÃO.
Quase todas as religiões possuem o seu próprio sistema de salvação ou libertação. No caso do hinduísmo a alma do homem (atmã) está presa a um repetitivo ciclo de vida e morte. O fiel hindu está sempre em busca dessa libertação. Mas quais são os caminhos para chegar a esse objetivo? Praticamente três: o caminho da ação, o caminho do conhecimento e o caminho da devoção. 
“O caminho da ação (carma-oiga) é o caminho da ação altruísta; uma pessoa precisa fazer o seu dever (dharma), como estudar ou fazer boas ações, mas não por medo de culpa ou da punição, ou por esperança de louvores ou recompensa. [...]. De acordo com o caminho do conhecimento (jnana-ioga), atingido o conhecimento dos escritos sagrados pode-se adquiri uma sabedoria transformadora que destrói o carma passado. O verdadeiro conhecimento é uma percepção da real natureza do universo, do poder divino e da alma humana. [...]. O terceiro caminho é o mais enfatizado em todo o Bhagavad Gita: o caminho da devoção (bhakti-ioga). Esse caminho talvez seja o mais popular entre os hindus de qualquer posição social. (NARAYANA, 2007, p. 144-145).
Fazer bem ao próximo, adquirir conhecimento dos textos sagrados e ter uma vida devocional, segundo o hinduísmo, são os caminhos para libertar o atmã do ciclo de vida e morte. Mas isso realmente funciona? Cabe somente ao hindus responderem.


DIVISÃO SOCIAL.
Na cultura ocidental é muito comum dividir a sociedade em classes, ou seja, classe alta, média e baixa. É a condição econômica e social que vai definir a que classe uma pessoa pertence. Mas essa divisão não é algo predestinado desde o nascimento. Existe uma certa transitoriedade, isto é, uma pessoa que pertence à classe baixa (com esforço e dedicação) pode mudar de vida, e com isso migrar para a classe média ou alta. 

Infelizmente isso não acontece no sistema de casta da Índia. Não existe mudança de uma casta inferior para outra superior. Uma pessoa que nasceu em uma casta especifica permanecerá nela por toda a vida, e não faz muita diferença se a pessoa é rica ou pobre. Em outras palavras, é a casta que diz qual é o lugar da pessoa na sociedade indiana.

Küng (2004, p. 61) explica de modo objetivo o sistema de casta na Índia:

  • acima de todos, a elite clerical dos brâmanes: sacerdotes, poetas, pensadores, sábios;
  • em seguida, a aristocracia dos kshatriyas: guerreiros, governantes;
  • mais adiante, os vaishyas, com frequência ricos: comerciantes, camponeses, operários;
  • então, a massa dos shudras: criados, trabalhadores, proletários – cerca de quinhentos milhões;
  • e, além desses, ainda os cerca de cento e cinquenta milhões que não pertencem a nenhuma casta: os sem casta, os outcasts, os “intocáveis”, chamados por Gandhi eufemisticamente de filhos de Deus (hrijan).


Narayanan (2007, p.160-161) comenta como Gandhi lutou contra o preconceito e discriminação em relação aos “intocáveis” (sem-casta), 
“Mahatma Gandhi, por exemplo, procurou superar o preconceito contra algumas das pessoas em desvantagem na sociedade indiana, os chamados “intocáveis” – aqueles cujas ocupações as castas “superiores” consideravam “sujas” e “degradantes”. Essas ocupações incluíam lidar com couro e cadáveres de animais, porque se considera que a pele e a carne mortas conspurcam (a palavra “pária”, que designa os que não tem casta, vem do tâmil pariab – “tambor” --, o que é explicado pelo fato de a membrana do tambor ser feita de couro “sujo” de animal). Gandhi chamava de harijan (“Filhos de Deus”) os sem-casta, e a constituição indiana pós-independência tornou ilegal a discriminação contra eles. Até agora, no entanto, as declarações oficiais tiveram pouco resultado na prática”.
Não existe cultura perfeita, mas não podemos negar que existem culturas melhores e outras piores. O sistema de castas indiano visto pelos olhos ocidentais pode causar repúdio e indignação, mas também não podemos negar que em países ocidentais “desenvolvidos”, o preconceito, o racismo e a discriminação estão muito presentes. E isso revela que independente da religião, da cultura ou do país, os humanos são produtores de mazelas da sociedade, e é necessário sempre fazer uma autocrítica de si mesmo com o objetivo de corrigir os próprios erros.

Concluído, o hinduísmo é uma religião fascinante, exótica e contraditória. Ela mostra como o ser humano é religioso e obcecado pelo sagrado. Acredito que sociedades seculares, que de certa forma desprezam o fator religioso, poderiam aprender coisas interessante sobre a humanidade com o hinduísmo.


FONTES
KÜNG, Hans. Religiões do mundo: em busca de pontos comuns. Campinas. Verus, 2004.
NARAYANAN, Vasudha. Hinduísmo. In: COOGAN, Michael D. (Org). Religiões. São Paulo. Publifolha, 2007.
WILLIS, Roy. Mitologias. São Paulo. Publifolha, 2007.