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19 de dezembro de 2016

RESUMO: "O MISTICISMO APOCALÍPTICO DO APÓSTOLO PAULO".

Algo novo sobre Paulo, é o que o Dr. Jonas Machado em seu livro "O misticismo apocalíptico do apóstolo Paulo" traz para os leitores brasileiros. Tudo o que até hoje foi escrito sobre o apóstolos dos gentios, sempre ficou reduzido ao âmbito teológico confessional, e isso tem criado um tipo de conhecimento limitado, e pior de tudo, repetitivo. Não desprezando a teologia, Jonas Machado segue por outro viés, que é o da experiência religiosa de Paulo. Na introdução da obra, Jonas Machado diz qual é o objetivo da pesquisa.
"Portanto, o conteúdo deste livro tem como foco a experiência religiosa em contraste com o sentido mais racionalista de "teologia" devido ao caso em questão, ao mesmo tempo em que reconhecemos que não é possível separar totalmente as duas dimensões. Assim, a expressão "misticismo apocalíptico" coloca em mente em primeiro plano a experiencia religiosa, e não a teologia, como também indica o subtítulo do livro" (p. 20).
O autor reconhece que é uma tarefa difícil tentar resgatar a experiência religiosa de Paulo. No entanto, há fontes que fazem com que o trabalho não seja impossível. Uma das fontes são as cartas de Paulo aos coríntios, onde Paulo deixou registrados alguns aspectos de suas experiências misticas. Para poder recuperar o contexto religioso do tempo de Paulo, Jonas Machado faz uso também da Bíblia Hebraica, da Septuaginta, Apócrifos e Pseudepígrafos, e os Manuscritos do mar morto da seita de Qumram

Neste post farei apenas um resumo sucinto dos capítulos dessa obra tão importante, que vem contribuir para um entendimento mais amplo sobre Paulo e sua experiência religiosa. O leitor interessado poderá usar esse resumo apenas como um ponto de partida, caso queira adquirir a obra e lê-la. 

Paulo de Tarso foi um "judeu místico-apocalíptico", e é isso que Jonas Machado quer mostrar em sua obra. No capítulo que tem como título "o contexto religioso de Paulo", o autor tenta adentrar no ambiente religioso onde Paulo viveu e saber quais foram os paradigmas, que supostamente, deram base a sua experiência religiosa. No decorrer da leitura fica muito nítido como é difícil para um pesquisador resgatar traços da religiosidade paulina do I século.
"A questão, entretanto, é que a experiência religiosa, mesmo que difícil de pesquisar, não é apenas mais um elemento, mas um aspecto determinante para a compreensão do fenômeno religioso paulino" (p. 63). 
Neste capítulo o autor mostra a diferença entre "Apocalíptica", "Apocalipsismo" e "Apocalipse".
Apocalíptica seria uma perspectiva religiosa ou uma forma de ver os planos divinos em relação com realidades mundanas ou terrenas. Apocalipsismo seria o universo simbólico em que está inserido o movimento apocalíptico. Este procura construir uma nova ordem no lugar da presente ordem da sociedade dominante. Apocalipse seria um gênero literário (p.74).
Paulo está ligado ao terceiro aspecto. Ele como filho do seu tempo foi muito influenciado pela literatura apocalíptica, e em algumas de suas cartas (em destaque aos coríntios) deixar isso muito claro. E para melhor fundamentar usa tese, Machado faz uso de livros apócrifos como 1Henoc, 2Henoc, Manuscritos do mar morto, A ascensão de Isaías e o Apocalipse de Sofonias. Mas o que há de importante nesses livros que foram considerados "heréticos" pela comunidade judaica e cristã? A resposta é que eles fazem parte do mesmo gênero literário de algumas cartas de Paulo, que nesse caso é a apocalíptica. E por isso eles podem ajudar na tentativa de compreender as influências místico-religiosas que influenciaram Paulo na composição de suas cartas aos coríntios. Em suma, nem tudo o que está escrito nos apócrifos e pseudepígrafos pode ser descartado!

A parte mais importante da obra é o capítulo que tem como título "Paulo e os coríntios". É aqui onde o autor desenvolve toda a sua tese sobre a experiência religiosa de Paulo. Na verdade esse capítulo é uma exegese das cartas de Paulo aos cristãos da cidade de corinto. Jonas Machado traz uma nova metodologia à luz da experiência religiosa. 


Nas palavras de Machado: "à um crescente reconhecimento de que é impróprio partir de Atos para Paulo para estabelecer a carreira dele" (p.153). Atos dos apóstolos foi escrito por Lucas, que segundo a tradição, foi cooperador de Paulo, e com isso proporcionando um conhecimento de "segunda mão" sobre Paulo. Para entender Paulo e suas experiências místicas-apocalípticas é necessário ir primeiramente na fonte, que nesse caso são as suas cartas. Ou seja, o caminho certo é olhar o testemunho do próprio Paulo, para depois ir até as narrativas de Atos. E nesse caso as cartas aos corintios são o foco da análise.

Machado analisa exegeticamente passagens como 2Co 12:1-10, para provar que o arrebatamento de Paulo era um padrão em sua vida, isto é, que essa experiência mística de ser transportado em espírito aos céus foi uma característica dos antigos místicos judeus do passado, e que isso não ocorreu uma única vez na vida Paulo, mas provavelmente outras vezes.
"Nesse testemunho paulino existem evidências suficientes de uma linguagem tradicional da apocalíptica judaica. Os termos e expressões "visões e revelações", "ser arrebatado", "terceiro céu", "paraíso" e até mesmo "fraqueza", "perseguição", "angústia" e "anjo de Satanás" são típicos e revelam um campo semântico apocalíptico. Esse relato visionário é único e breve, mas ele mostra o quanto Paulo depende de conceitos até mesmo de práticas litúrgicas apocalípticas que ele mesmo experimentou, concebeu e adaptou à sua carreira como apóstolo de Jesus Cristo" (p. 166).
Infelizmente à teologia dogmática racionalista é muito incompetente para ver esse lado místico-apocalíptico de Paulo. Em muitas situações os cristãos acabam tendo uma visão errada sobre quem foi realmente Paulo e quais foram as experiências que ele teve com Deus. 

A obra de Jonas Machado, ao meu ver, procura trazer de volta para a mesa de discussão algo que teologia dogmática jogou fora, que a experiência religiosa dos primeiros cristãos, e nessa caso as experiências de um dos personagens mais importantes na história do cristianismo, Paulo de Tarso. 


Sobre o autor: Jonas Machado, pastor batista, doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e mestre em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo, é especialista em história e literatura do cristianismo primitivo. 

13 de dezembro de 2016

RELIGIÃO E LUTO - O que as religiões entendem sobre a morte?


Ninguém gosta da morte, mas também nenhum ser vivo conseguiu escapar dela. Para morrer basta estar vivo. O luto é um momento muito difícil. A morte de uma pessoa querida pode causar mudanças radicais na vida de uma família. Ela pode aproximar as pessoas como também pode separá-las. E quando existe herança do falecido para ser repartida, aí à situação pode se agravar ainda mais. Esses são apenas alguns dos efeitos sociais que a morte causa.

Outro efeito é levar as pessoas a pensarem e refletirem sobre a transitoriedade da própria existência humana. O homem nasce, cresce, se reproduz e morre. Esse ciclo repetitivo acompanha a humanidade desde a sua origem. E durante esse tempo as pessoas sempre fizeram essas perguntas: O que acontece depois da morte? Será que só existe esta vida terrena? As religiões (cada uma ao seu modo), sempre tentaram dar um resposta para esses questionamentos existenciais. Que de tempos em tempos voltam a atiçar à cabeça das pessoas.

Em nossa sociedade ocidental que se tornou materialista e hedonista, o tema morte é um grande tabu. Entretanto, é necessário encararmos esse assunto de frente, principalmente quando as crianças fazem perguntas sobre à vida, seja em casa e na escola. 

O objetivo dessa postagem é tentar entender como à morte é vista nas grandes tradições religiosas. E também, na medida do possível, amadurecer nosso entendimento sobre essa temática. 

1. Cristianismo
É consenso entre os cristãos a crença na existência de vida após a morte. Entretanto, católicos e protestantes possuem algumas ideias diferentes sobre esse tema. Além da crença do céu e inferno, os católicos defendem a existência de um lugar chamado purgatório.
"Embora haja distinções entre os cristãos quanto ao que qualifica a pessoa para a salvação ou a condenação eterna, é consenso em todas as denominações que os salvos passarão a eternidade recompensados na paraíso ou no céu, ao passo que os condenados serão punidos para sempre no inferno. A localização exata da vida eterna é uma questão complexa tanto para os teólogos quanto para os devotos. Na Idade Média os cristão viam quatro locais possíveis para a alma depois da morte: céu, inferno, purgatório ou limbo". (HALE, 2007, p. 84).
Historicamente algumas Igrejas cristãs que são originárias da Reforma Protestante não aceitam a ideia do purgatório. Para essas comunidades somente a fé em Cristo é suficiente para conduzir a alma do falecido ao reino dos céus. Para os protestante a ideia do purgatório passa a mensagem de que à morte de Cristo na cruz não foi totalmente eficaz. Esse é um ponto de divergência. Para um estudo mais especifico sobre o purgatório acesse este link: Purgatório.

Um ponto importante que quero destacar aqui é que a morte para o verdadeiro cristão não é algo que cause medo. Pelo contrário, deve ser vista como uma porta de entrada para a bem-aventurança eterna. Infelizmente em nossa sociedade ocidental contemporânea, a morte causa muito medo nas pessoas. Talvez um dos principais motivos para isso seja não saber o que existe do "outro lado da vida". 

Na Idade Média morrer era visto como algo normal. Até mesmo as pessoas ao saberem que a morte estava próxima, se preparavam para recebê-la.  
"Sem fanfarronadas, sem criar casos, sem se vangloriar de que não morriam; todos admitiam a morte tranquilamente (grifo do autor). Não apenas não retardavam a o momento de prestar contas, como também se preparavam calma e antecipadamente, designavam quem ficaria com o jumento, quem ficaria com a galinha... E extinguiam-se com uma espécie de alívio como se devessem simplesmente mudar de isbá" (ARIÈS, 2012, p. 40).
Que diferença entre os medievais e os contemporâneos! Os primeiros conseguiram "domesticar" a morte, ou seja, ela não causava medo neles. Eles viam a morte como algo normal da existência humana. Por traz disso estava a crença de que ao morrer, a alma do falecido estaria segura com Deus. 

Já os contemporâneos, por viverem em uma sociedade liquida, que não tem valores e convicções, acabam sendo "domesticados" pela morte. Ela causa medo. E tudo deve ser feito para evitá-la. Com isso posso afirmar que os medievais tinham mais tranquilidade diante da morte do que os contemporâneos. Para eles a morte não era um tabu.

2. Islamismo.
A comunidade islâmica também acredita que existe vida após a morte. Semelhante aos cristãos, os muçulmanos creem que haverá uma grande ressurreição dos justos e o juízo final. Só que o caminho para se alcançar a vida eterna é ser fiel aos ensinamentos do Alcorão. 
"... a tradição islâmica mantém-se fiel à ideia da vida após a morte, cujo conhecimento só pode ser adquirido por meio da revelação divina, o Alcorão. Considera-se a crença na vida após a morte um aspecto essencial da fé islâmica, porque com ela os muçulmanos afirmam Deus e sua presença venerável. Ela também explica o significado e a finalidade desta vida, com suas muitas provações e exigências" (GORDON, 2007, p. 118).
Para o cristão é a fé em Cristo que garante a entrada no paraíso, para o muçulmano é a fé no Alcorão que vai lhe dar à certeza de que após a morte ele estará seguro. Cada religião tem sua forma particular de entender o pós-morte.

3. Hinduísmo.
Diferente dos cristãos e muçulmanos, os hindus acreditam na ideia de reencarnação da alma. A doutrina do carma é de grande importância para entender a ideia de vida após a morte no Hinduísmo. 
"A lei do carma refere-se, assim, a um sistema de causa e efeito que pode abarcar várias vidas: os seres humanos ganham mérito (punya) ou demérito (papa) com base em cada ação realizada" (NARAYANAN, 2007, p. 136).
O que se faz aqui trará consequências nas outras vidas. A lei do carma tem uma influência muito grande no comportamento dos hindus. Se alguém deseja viver melhor em outra reencarnação terá que se esforçar para fazer boas ações na presente vida. Caso contrário, as outras vidas não serão muito boas.

Há no hinduísmo vários textos sagrados como: Vedas, Upanishard, Bragavad-Gita e os Puranas. Esses textos são que dão base as crenças religiosas do hinduísmo.  Um coisa interessante é que os puranas relatam a existência de céus e infernos no universo religioso hindu.
"Embora a reencarnação e a libertação sejam os aspectos da vida após a morte mais discutidos no hinduísmo, os Puranas falam de muitos tipos de céus e infernos. Em alguns textos descrevem-se detalhadamente sete mundos inferiores e sete céus, conquanto os relatos das diversas regiões paradisíacas refiram-se normalmente a dançarinas e árvores que realizam desejos - um imaginário de um lugar de deleite orientado pela perspectiva masculina. Na tradição hindu a permanência de uma alma num inferno ou paraíso geralmente é vista como temporária. A alma renasce numa dessas regiões se acumulou alguns tipos de carmas bons ou maus; mas, quando esse carma se esgota, ela passa para uma forma de existência diferente" (NARAYANA, 2007, p. 157).
Céu e inferno não são crenças exclusivas de cristãos e muçulmanos, até os hindus acreditam nisso. A diferença é que a permanência no céu ou inferno vai depender da quantidade de carma que a alma do falecido tem. É interessante quando se descobre que existem pontos comuns entre as diferentes religiões. 

4. Budismo.
Como o budismo foi um movimento religioso que saiu do hinduísmo, muito do que os budista entendem sobre vida após a morte veio do hinduísmo.
"As ideias budistas tradicionais sobre a morte baseiam-se na antiga doutrina indiana do samsara, traduzindo como "reencarnação", "transmigração" ou simplesmente "renascimento", mas que significa literalmente "rotação" de uma vida para outra" (ECKEL, 2007, p.192).
A diferença é que Buda procurou quebrar esse ciclo repetitivo de reencarnações. Para ele a samasa era uma prisão eterna. Mas como assim? Buda viu que as pessoas eram obcecadas em fazer boas obras com o objetivo de alcançar uma vida melhor. E isso causava apego e consequentemente o sofrimento. Em suma, alimentar a roda da samasa com ações cármicas não trazia para o budista a libertação do sofrimento. Era necessário alcançar o nirvana. Significado do nirvana
"De acordo com a tradição budista, Buda atingiu o nirvana em duas etapas. Sob a árvore bodhi, no momento do seu "despertar", ele entendeu que não estava mais alimentando o samsara com ações cármicas; em outras palavras, todo o desejo nele havia acabado. Décadas mais tarde, no momento de sua morte, conhecido como parinirvana ou "nirvana final (ou completo)", todo o carma residual de Buda se esgotou e ele foi inteiramente libertado do samsara, para nunca mais reencarnar. Com sua morte, ele parou de existir" (ECKEL, 2007, p. 192).
A ideia do nirvana distancia o budismo do hinduísmo. Agora o alvo de todo budista não é viver reencarnado constantemente, mas sim se libertar desse ciclo e deixar de existir. Com isso, é possível afirmar, que o conceito de céu e inferno não tem espaço no mundo religioso budista. 


Fontes:
ARIÈS, Philippe. História da morte no ocidente: da Idade Média aos nossos dias. Rio de Janeiro. Nova fronteira, 2012. 
HALE, Rosemary Drage. Cristianismo. In: COOGAN, Michael. Religiões. São Paulo. Publifolha, 2007.
GORDON, Matthew S. Islamismo. In:____
NARAYANA, Vasudha. Hinduísmo. In:____
ECKEL, Malcolm David. Budismo. In:____

6 de dezembro de 2016

JUDAÍSMO - A religião dos tempos de Jesus.


Jesus de Nazaré foi um judeu e isso é inquestionável. Ele nasceu, cresceu e viveu em uma cultura judaica. Qualquer pessoa que queira compreender mais profundamente quem foi Jesus, inevitavelmente, terá que conhecer o judaísmo. É impossível separar Jesus do seu contexto cultural.  

O presente texto vai se fundamentar no eixo temático culturas e tradições religiosas. Que “é o estudo do fenômeno religioso à luz da razão humana, analisando questões como: função e valores da tradição religiosa, relação entre tradição religiosa e ética, teodiceia, tradição religiosa natural e revelada, existência e destino do ser humano nas diferentes culturas” (PCNER, 2009, p.50). 

E tem o objetivo de proporcionar um conhecimento básico sobre o judaísmo. Dando atenção às origens históricas, crenças, à vida devocional dos judeus e à relação de Jesus com o judaísmo de sua época.

1. ORIGENS HISTÓRICAS.
Historicamente não se sabe como surgiu o judaísmo. Ele vai progressivamente sendo formado com o passar do tempo. O principal documento histórico que registra os primeiros passos da criação do judaísmo é a Bíblia Hebraica. É nela onde estão preservados os primeiros fatos que mostram como o judaísmo tomou forma. Tudo indica que Abraão e Moisés são os principais fundadores do judaísmo, ou seja, foram eles que construíram às bases de sustentação do judaísmo. Nas palavras de Wilkinson:
“Ninguém sabe ao certo como ou quando o judaísmo surgiu, mas segundo a Bíblia duas figuras foram cruciais para a sua origem. A primeira delas foi Abraão, o patriarca dos judeus, que migrou da Mesopotâmia (o atual Iraque) para a terra de Canaã no Mediterrâneo oriental. A fome impeliu os descendentes de Abraão de lá para o Egito, onde viveram como escravos. Mais tarde seu líder Moisés os levou de volta para Canaã, que Deus prometera aos judeus no tempo de Abraão” (WILKINSON, 2011, p.62).
Há alguns detalhes sobre a vida de Abraão e Moisés que precisam ser mencionados. E que muitas vezes não são observados pelos leitores da Bíblia. Em primeiro lugar, o patriarca Abraão não foi um judeu, ele foi um mesopotâmico. Abraão nasceu e cresceu em um ambiente politeísta, isto é, ele viveu em uma cultura onde várias divindades eram cultuadas.

Em um momento de sua vida, e que está registrado no livro do Gênesis, Abraão teve uma experiência mística com uma divindade que muito tempo depois seria conhecida pelos judeus como YHWH (Javé ou Jeová). Em obediência a essa divindade, Abraão junto com outras pessoas, deixa a sua terra e vai em busca de uma terra cuja a divindade prometeu que seria sua. É com Abraão que o monoteísmo judaico (adoração a um único Deus) começa a tomar forma.

Em segundo lugar, Moisés foi um judeu criado na cultura egípcia. Conforme os relatos que estão registrados no livro do Êxodo, Moisés (que é um nome de origem egípcia), ainda bebê foi encontrado pelas criadas e a filha do faraó, dentro de um cesto no rio. Durante boa parte de sua vida Moisés foi criado e educado segundo os preceitos egípcios. Infelizmente a própria Bíblia não é muito clara sobre esses aspectos “ocultos” da vida de Moisés. Há muitos detalhes sobre ele que continuaremos sem saber. Entretanto, pode-se afirmar que Moisés foi um homem de vasta cultura e conhecimento.

O Êxodo foi um dos acontecimentos mais importantes para os judeus. Pois mostra como o Deus Javé que por intermédio de Moisés conseguiu tirá-los da escravidão do Egito e conduzi-los de volta para a terra que prometeu a Abraão e seus descendentes.  

2. A CRENÇA JUDAICA.
2.1. MONOTEÍSMO.
A base da confissão de fé judaica é: “Ouve, ó Israel: Javé nosso Deus é o único Javé! Portanto, amarás a Javé teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força” (Deuteronômio 6.4).

Para os judeus só existe um único Deus, e ele é o criador e sustentador do mundo. Sua adoração não pode ser direcionada para nenhum outro deus ou objeto. O Deus único do judaísmo não tem imagem ou ícone. Nada que existe na terra pode ser usado para representá-lo. Até mesmo os judeus evitam pronunciar o nome de Deus, pois o tal é sagrado.

Em comparação com o cristianismo, o judaísmo não reconhece Jesus de Nazaré como “Deus encarando”. A divindade de Jesus é um dogma exclusivo dos cristãos, o qual não encontra espaço na crença judaica. Se há somente um único Deus, como um judeu pode prestar culto e adoração a outro deus? Se fosse assim, o judaísmo seria uma religião politeísta e não monoteísta.  

2.2. O MESSIAS.
As alas ortodoxa e conservadora do judaísmo ainda preservam à crença na vinda de um futuro messias. Que será um personagem escatológico que reinará sobre Jerusalém e restaurará o Templo e trará paz ao mundo.
“Essa crença messiânica continua forte no judaísmo ortodoxo, cujos seguidores creem que um Messias reinará um dia em Jerusalém, onde reerguerá o Templo. Outros ramos do judaísmo dão menos ênfase à crença messiânica, concentrando-se nos modos como os mandamentos de Deus devem ser obedecidos” (WILKINSON, 2011, p. 66).
O judaísmo não acredita que Jesus de Nazaré seja o messias prometido. Ele está mais para um judeu subversivo - que tentou reformar a religião - do que um messias. Para o judaísmo Jesus não é o messias por que ele não reina sobre Jerusalém e não restaurou o templo. Porém, o judaísmo não nega a historicidade de Jesus, ele realmente existiu. Entretanto, ele é reconhecido como Messias apenas na crença cristã clássica.    

2.3. A TORÁ E O TALMUDE.
O judaísmo é uma religião do livro e consequentemente erudita. A essência da fé judaica está contida nos seus textos sagrados, mais especificamente na Torá, que quer dizer ensino ou instrução. Todo judeu deve ser um profundo conhecedor das leis e mandamentos que estão registrados na Torá. E para isso é necessário que ele tenha um domínio básico da língua hebraica. Só assim ele será capaz de ler e interpretar os textos da Torá. Por ser o texto mais sagrado do judaísmo, nas sinagogas a Torá é guardada em um lugar especial chamado Arca.
“Toda sinagoga tem um exemplar da Torá, escrito à mão em hebraico num rolo que é mantido num armário chamado Arca, o ponto focal da sinagoga. Cada rolo é escrito com grande cuidado, pois o texto nunca muda e deve ser transcrito com exatidão. O texto é sagrado demais para ser tocado com a mão. A pessoa que lê a Torá de uma sinagoga usa um ponteiro especial, yad, com uma mão de metal na ponta, para seguir as palavras. Isso assegura que o texto não fique danificado. Caso isso ocorra, o rolo é declarado inútil e enterrado num cemitério judaico dentro de um vaso de barro”. (WILKINSON, 2011, p. 68).
O Talmude é o resultado de vários anos de comentários, discussões e interpretações feitas pelos rabinos e eruditos judeus. Ele é constituído pela Mixná e a Gemara. Essas duas obras juntas formam o Talmude, que segundo Wilkinson é constituído “com cerca de 2,5 milhões de palavras, abrange temas diversos como folclore e preces, rituais e remédios. Cerca de um terço desse material é halakha, ou lei; o resto são histórias e lendas e máximas conhecidas como a aggadah. ” (2011, p. 69).


3. A DEVOÇÃO JUDAICA.
A prece é o centro da prática religiosa judaica. Os judeus têm o hábito de fazerem suas rezas pela manhã, à tarde e à noite. E também em momentos especiais como no sábado e nas festas. As preces podem ser feitas usando as próprias palavras ou recitando trechos do livro de orações conhecido como SidurOs homens em seus momentos devocionais cobrem a cabeça com um pequeno gorro que se chama quipat. Outro acessório muito usado é um tipo de véu posto sobre a cabeça conhecido como tallit.

O uso dos filactérios no uso devocional é muito comum entre os judeus. São pequenas caixas presas na testa e no braço do devoto, que guardam trechos da Torá, mais especificamente o Shema. Essa prática serve para sempre lembrar ao fiel judeu que à lei de Deus deve sempre está na mente e no coração.

Além da prece à sinagoga tem muita importância para a devoção judaica. É bom dizer que, quase todas as religiões possuem os seus lugares sagrados particulares. Para os cristãos são às Igreja, para os muçulmanos às mesquitas, e para os judeus às sinagogas. São nas sinagogas onde à comunidade judaica se reúne para aprender mais sobre as Escrituras, tradições e também fortalecer a socialização dos fiéis. 

As sinagogas são dirigidas pelos rabinos, que são os líderes espirituais da comunidade. Eles têm as funções de organizar e conduzir o culto, pregar, educar e aconselhar. Os primeiros rabinos não eram remunerados. Porém com o passar do tempo tornaram-se líderes remunerados.  

O sábado é um dia sagrado para os judeus. “Clímax da semana judaica, vai do pôr do sol da sexta-feira ao de sábado. Em casa, os judeus o assinalam acendendo velas e orando. Fora de casa, o respeito ao sábado varia de um ramo do judaísmo para o outro. Essencialmente, porém, é uma ocasião para repouso, culto e convívio com a família ou a comunidade” (WILKINSON, 2011, p. 77).

4. JESUS E O JUDAÍSMO.
Uma coisa bem interessante é saber que nos tempos de Jesus à Igreja cristã ainda não existia. Naquele tempo somente existiam o judaísmo e as religiões pagãs do Império Romano. Somente muitos anos depois é que os seguidores de Jesus (que não eram conhecidos como cristãos, mas como uma nova seita), iriam criar os fundamentos para o advento do cristianismo.

Jesus e seus primeiros discípulos eram judeus e tudo o que eles sabiam sobre à criação do universo e à origem da humanidade vinham do judaísmo. Infelizmente Jesus não deixou nada escrito. Tudo o que se sabe sobre sua vida e ensinos foi escrito por seus seguidores, ou seja, o conhecimento sobre Jesus é um conhecimento de segunda mão. Talvez se o próprio Jesus tivesse escrito os evangelhos hoje teríamos uma compreensão diferente sobre ele.

A visão que os evangelhos transmitem sobre Jesus é a de um judeu subversivo, isto é, um indivíduo que está sempre em conflito com as autoridades religiosas e próximo de pessoas rejeitadas pela sociedade judaica como: cegos, leprosos, prostitutas, ladrões, ricos gananciosos, samaritanos, etc. E conforme os relatos dos evangelhos Jesus não era bem visto pelos religiosos de seu tempo.

Mas o que realmente Jesus queria com tudo isso? Somente se tornar famoso e ser visto? Ou somente causar tumulto e agitação? É possível afirmar que Jesus teria à intensão de reformar a sua própria religião, neste caso o judaísmo. Provavelmente Jesus queria que a essência da Torá não fosse substituída pelas interpretações dos fariseus. Talvez por isso ele tenha tomado a postura de um reformador religioso. 


Fontes:
FONAPER: Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo, Mundo mirim, 2009.
WILKINSON, Philip. Religiões: guia ilustrado Zahar. Rio de Janeiro, Zahar, 2011.